ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da administração de medicamentos: identificando riscos e implementando barreiras de segurança

Drug administration assessment: risk identification and implementation of safety barriers

Evaluación de la administración de medicamentos: identificación de riesgos e implementación de barreras de seguridad

Camerini, Flavia Giron;[1] Lage, Juliane Silveira Lobo;[2] Fassarella, Cintia Silva;[3] Henrique, Danielle de Mendonça;[4] Franco, Andrezza Serpa[5]

RESUMO

Objetivo: avaliar a segurança do paciente na administração de medicamentos a fim de identificar condições geradoras de risco. Método: pesquisa quantitativa descritiva do tipo survey interseccional, os dados foram coletados por um instrumento semiestruturado e validado para a Avaliação da Segurança do Paciente na Administração de Medicamentos. Resultados: participaram 139 profissionais, a maioria do sexo feminino (84,89%), com idade de 20 a 35 anos (60,43%), Enfermeiro(a) (71,94%) e com tempo de atuação profissional menor de 2 anos (38,85%). As variáveis geradoras de riscos relacionadas aos medicamentos obtiveram uma frequência positiva superior a 60%. As variáveis relacionadas ao processo de administração de medicamentos obtiveram uma frequência de respostas positivas superior a 50,00%. Conclusão: a administração de medicamentos foi classificada como segura, visto que as respostas positivas foram superiores a 60,00%. As principais condições geradoras de risco foram relacionadas à ordem verbal e à identificação de alergia.

Descritores: Segurança do paciente; Enfermagem; Erros de medicação; Uso de medicamentos; Cuidados de enfermagem

ABSTRACT

Objective: to assess patient safety in drug administration to identify risk-generating conditions. Method: descriptive quantitative research of the intersectional survey type, the data were collected using a semi-structured and validated instrument for the Assessment of Patient Safety in the Administration of Medicines. Results: 139 professionals participated. Mostly female (84.89%), aged from 20 to 35 years (60.43%), Nurse (71.94%) and with professional experience under two years old (38.85 %). Variables that generate risks related to medicines obtained a positive frequency above 60%. The variables related to the medication administration process obtained a frequency of positive responses of 50,00%. Conclusion: medication administration was classified as safe, as positive responses were greater than 60,00%. The main risk-generating conditions were related to verbal order and allergy identification.

Descriptors: Patient safety; Nursing; Medication errors; Drug utilization; Nursing care

RESUMEN

Objetivo: evaluar la seguridad del paciente en la administración de medicamentos para identificar las condiciones generadoras de riesgo. Método: investigación cuantitativa descriptiva del tipo encuesta interseccional, los datos fueron recolectados mediante un instrumento semiestructurado y validado para la Evaluación de la Seguridad del Paciente en la Administración de Medicamentos. Resultados: participaron 139 profesionales. La mayoría mujeres (84,89%), de 20 a 35 años (60,43%), Enfermeras (71,94%) y con experiencia profesional menores de dos años (38,85%). Las variables que generan riesgos relacionados con las drogas obtuvieron una frecuencia positiva superior al 60%. Las variables relacionadas con el proceso de administración de medicamentos obtuvieron una frecuencia de respuestas positivas superior al 50,00%. Conclusión: la administración de medicamentos se clasificó como segura, ya que las respuestas positivas fueron superiores al 60,00%. Las principales condiciones generadoras de riesgo estuvieron relacionadas con la orden verbal y la identificación de alergia.

Descriptores: Seguridad del paciente; Enfermería; Errores de medicación; Utilización de medicamentos; Atención de enfermería

INTRODUÇÃO

Na assistência em saúde prestada a população no âmbito hospitalar destaca-se a administração de medicamentos como atividade frequente da terapêutica. Atualmente casos envolvendo diversos tipos de erros na etapa de administração medicamentosa ocorrem com frequência na prática hospitalar.1

Um estudo realizado em São Paulo (Brasil) no ano de 2014 avaliou erros na administração de medicação utilizando a análise de causa raiz e identificou 54 erros de medicação sendo 17 (31,50%) os erros de omissão, 12 (22,20%) erros de horário, 8 (14,80%) erros de técnica de administração, 8 (14,80%) erros de dose, 4 (7,40%) erros de doses extras, 4 (7,40%) erros de medicamentos não autorizados 1 (1,90%) e erros de via de administração.2

Em âmbito mundial, no ano de 2017 a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou o desafio global para a segurança do paciente sobre o Uso Seguro de Medicamentos (Medication without harm) que visa melhorar a segurança medicamentosa nas diferentes etapas do sistema de medicação. O desafio reforça a necessidade de estratégias que possam reduzir os possíveis erros e incidentes que podem ser mitigados.3-4

A administração de medicamentos é um processo, que exige conhecimento técnico e prática dos profissionais de saúde envolvidos em cada uma das etapas. Estima-se que os incidentes raramente ocorram por negligência, mas sim por falhas apresentadas no sistema, fadiga dos profissionais e escassez de pessoal capacitado, o que por sua vez, afeta as etapas do sistema de medicação.3

Visto que a maior parte dos erros na etapa de administração podem ser evitados, neutralizados ou até mesmo impedidos. O Desafio Global de Segurança do Paciente, lançado pela OMS, propõe a adoção de estratégias para melhorar a assistência medicamentosa, visando que ela seja livre de possíveis danos.4

Na prática assistencial ao paciente crítico a enfermagem é a principal responsável por aprazar, preparar e administrar medicamentos. Para que esse processo seja realizado de forma segura é fundamental a criação de barreiras e estratégias de segurança para que o erro não atinja o paciente.5

A fim de aumentar a segurança na administração de medicamentos e uniformizar a avaliação do processo, um estudo brasileiro do estado do Ceará realizado em 2019, desenvolveu e validou um instrumento para Avaliação da Segurança na Administração de Medicamento (ASPAM). O ASPAM, na prática, se constitui como uma barreira de segurança que possibilita a identificação de possíveis condições de risco para ocorrência de eventos adversos na etapa de preparo e administração de medicamentos pela equipe de enfermagem.6

Esta pesquisa vislumbra aumentar a segurança na administração de medicamentos, uma vez que conhecer as condições geradoras de risco constitui-se como uma barreira para que novos incidentes não aconteçam na prática medicamentosa.

Nesta perspectiva, o presente trabalho teve como objetivo avaliar a segurança do paciente na administração de medicamentos a fim de identificar condições geradoras de risco.

MATERIAIS E MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo do tipo survey interseccional, em que as variáveis que serão encontradas deverão ser expressas sob a forma de dados numéricos e empregado rígidos recursos e técnicas estatísticas para analisá-las, com isso apresentando uma maior precisão e confiabilidade. Teve uma abordagem quantitativa na qual os dados foram coletados por meio de um instrumento semiestruturado e validado para a ASPAM.6

A pesquisa seguiu a diretriz do Standards for Quality Improvement Reporting Excellence (SQUIRE 2.0), relacionada a estudos de melhoria da qualidade e segurança do paciente, conforme recomenda a Enhancing the Quality and Transparency Of health Research (EQUATOR).

A pesquisa foi realizada no período de maio a agosto de 2020, e desenvolvida em um Hospital Universitário no Estado do Rio de Janeiro, que tem como característica ser hospital geral de nível terciário com diversas especialidades e que presta atendimento prioritariamente ao Sistema Único de Saúde (SUS).

A população total do presente estudo foi composta por 1260 profissionais de enfermagem, sendo o tamanho da amostra 295 profissionais, conforme cálculo amostral para uma amostra aleatória simples por conveniência, com margem de erro de 5%.

Foram incluídos profissionais da equipe de enfermagem, que tinham como atribuição a administração de medicamentos dentro do ambiente hospitalar, em setores abertos e fechados.

Foram excluídos questionários que foram preenchidos de maneira incompleta; profissionais que estavam afastados devido a férias, licenças, médicas e maternidade durante o período de coleta de dados; profissionais de enfermagem no âmbito da gerência e administração hospitalar.

O instrumento para ASPAM é uma ferramenta que possibilita a identificação de condições geradoras de risco e eventos adversos. Foi desenvolvido e validado à luz do protocolo4 de segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos sendo constituído por nove domínios que ao todo formam 28 itens.

Os domínios presentes no instrumento são: paciente certo, medicamento certo, via certa, hora certa, dose certa, registro certo da administração, orientação correta, forma certa e resposta certa. A frequência para cada um dos itens apresentados no presente instrumento é avaliada através da escala tipo Likert de cinco pontos onde as variáveis utilizadas foram: nunca, quase nunca, às vezes, quase sempre e sempre.

Para uma exposição clara dos resultados foi realizada a categorização das respostas em: respostas negativas, respostas neutras e respostas positivas. As respostas assinaladas como “nunca” e “quase nunca” tiveram sua resposta categorizada em respostas negativas, já as respostas assinaladas como “às vezes” foram categorizadas como neutras e as respostas assinaladas como “quase sempre” e “sempre” foram enquadrados como respostas positivas.

O domínio paciente certo possui um item que visa avaliar a frequência que o profissional utiliza, no mínimo, dois identificadores.

O domínio medicamento certo possui cinco itens que visam avaliar a frequência que o profissional confere o nome do medicamento; se leva o medicamento de forma individual; se administra por ordem verbal somente em emergência; se confere alergia e se identifica a alergia de forma diferenciada.

O domínio via certa possui quatro itens que visam avaliar a frequência que o profissional confirma a via na prescrição; verifica se a via é compatível; se lava as mãos antes de administrar e se utiliza técnicas asséptica antes de administrar.

O domínio hora certa possui três itens que visam avaliar com que frequência os profissionais de enfermagem preparam os medicamentos antes da administração; se administra o medicamento na hora certa e se adéqua os horários de administração das prescrições.

O domínio dose certa possui quatro itens que visam avaliar a frequência que o profissional confere atentamente a dose prescrita; que confere o gotejamento e a programação das bombas de infusão; se utiliza instrumentos de medida padrão ao preparar medicação; devolve à farmácia as sobras de medicamentos.

O domínio registro certo da administração possui quatro itens que visam avaliar a frequência que o profissional registra na prescrição o horário da administração; se registra todas as ocorrências relacionadas aos medicamentos; notifica os eventuais incidentes relacionados aos medicamentos e se identifica medicamentos preparados que serão armazenados.

O domínio orientação correta possui dois itens que visam avaliar a frequência que o profissional esclarece dúvidas da prescrição junto ao prescritor e se orienta o paciente e/o acompanhante sobre os medicamentos.

O domínio forma certa possui um item que visa avaliar a frequência que o profissional confirma se o medicamento é compatível com a via.

O domínio resposta certa possui dois itens que visam avaliar a frequência que o profissional avalia se o medicamento apresentou algum efeito desejado; informa os efeitos diferentes do esperado.

Para melhor visualização e análise dos dados foram criadas duas categorias relacionas os domínios abordados, são elas: variáveis geradoras de riscos relacionadas aos medicamentos na qual foram compiladas nos itens medicamento certo, via certa, hora certa e forma certa; e variáveis relacionadas ao processo de administração de medicamentos que compreende os itens paciente certo, dose certa, registro certo, orientação certa, resposta certa.

Ao final do instrumento havia um espaço para que os profissionais deixassem sugestões de estratégias e barreiras para melhoria da qualidade assistencial e para aumentar a segurança no processo de administração de medicamentos de forma geral.

Antes da aplicação do questionário para os profissionais participantes foram realizados dois pré-testes do instrumento juntamente com um grupo de pesquisadores para que o produto final apresentado aos sujeitos da pesquisa não possuísse falhas de compreensão de vocabulário, formatação, entre outras.

Os dados da pesquisa foram coletados através de um formulário estruturado de forma digital, que esteve disponível online para todos os profissionais, que por sua vez foi divulgado através de dispositivos eletrônicos de maneira remota, via e-mail e através de aplicativos de mensagens. Devido à Coronavirus Disease 2019 (Covid-19) a coleta dos dados foi realizada exclusivamente de formal online, através de um formulário no Google Forms.

Foi realizada uma análise descritiva com frequência simples e absoluta. Para a análise foi necessária uma verificação dos dados, codificação e tabulação, sendo posteriormente os dados digitados em planilhas do Microsoft Office Excel 2007, e analisados a luz da estatística descritiva.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa no dia 08 de abril de 2020 através do certificado de apresentação para apreciação ética: 26827019.4.1001.5259. Foram atendidas as exigências das Resoluções 455/2012 e 580/2018 do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, todos os participantes da presente pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Participaram do estudo 139 profissionais. A amostra inicialmente foi constituída por 147 profissionais de enfermagem, porém desses, oito precisaram ser excluídos devido à duplicidade de respostas, sem danos aos resultados. Não foi possível atingir o número calculado inicialmente de 295 profissionais, pois a pesquisa foi realizada durante a pandemia de ocasionada pelo novo coronavírus, sendo necessário atender as medidas de distanciamento social imposta pela instituição com o objetivo de conter a pandemia, dessa forma a pesquisa foi realizada exclusivamente de forma online o que por sua vez dificultou o processo de aderência dos profissionais.

Os profissionais participantes do estudo eram em sua maioria do sexo feminino com idade entre 20-35 anos, Enfermeiro(a) e com tempo de atuação profissional inferior a dois anos conforme apresentado na Tabela 1.

Dentre as variáveis geradoras de riscos relacionadas aos medicamentos todas obtiveram uma frequência de respostas positivas superior a 60,00%. A variável com maior frequência de resposta positiva foi a relacionada à via de administração certa – “Confirma a via na prescrição” (137; 98,56%), seguido do medicamento certo– “Confere o nome do medicamento” (134; 96,4%). A variável com maior frequência de resposta neutra foi relativa à hora certa – “Adéqua os horários dos medicamentos” (29; 20,87%). As variáveis com maior frequência de resposta negativa foram relacionadas ao domínio medicamento certo – “Ordem verbal somente em emergência” (17; 12,23%), seguido de “Identifica a alergia de forma diferenciada” (9; 6,47%) conforme apresentado na Tabela 2.

Dentre as variáveis relacionadas ao processo de administração de medicamentos todas obtiveram uma elevada frequência de respostas positivas (superior a 60%). A variável com maior resposta positiva foi relacionada ao domínio dose certa– “Confere atentamente a dose prescrita” (137; 98,56%), seguido de “Confere o gotejamento e a programação das bombas de infusão” (135; 97,12%). A variável com maior frequência de resposta neutra foi relativa à dose certa – “Devolve à farmácia as sobras dos medicamentos” (33; 23,75%). A variável com maior frequência de resposta negativa foi relacionada ao domínio registro certo – “Notifica os eventuais incidentes relacionados aos medicamentos” (34; 24,46%) seguido do domínio dose certa– “Devolve à farmácia as sobras dos medicamentos” (32; 23,02%) conforme apresentado na Tabela 3.

 

Tabela 3: Classificação das variáveis relacionadas ao processo de administração de medicamentos. Rio de Janeiro, Brasil, 2020. (n=139)

Variáveis relacionadas ao processo de administração de medicamentos

Respostas negativas

Respostas neutras

Respostas positivas

Paciente certo

N

%

N

%

N

%

Utiliza, no mínimo, dois identificadores

8

5,76

15

10,79

116

83,45

Dose certa

Confere atentamente a dose prescrita

0

0

2

1,44

137

98,56

Confere o gotejamento e a programação das bombas de infusão

1

0,72

3

2,16

135

97,12

Realiza dupla checagem

9

6,47

20

14,39

110

79,14

Utiliza instrumentos de medida padrão ao preparar medicação

7

5,03

6

4,32

126

90,65

Devolve à farmácia as sobras dos medicamentos

32

23,02

33

23,75

74

53,23

Registro Certo

Registra na prescrição os horários da administração

5

3,59

11

7,91

123

88,50

Registra todas as ocorrências relacionadas aos medicamentos

13

9,35

18

12,95

108

77,70

Notifica os eventuais incidentes relacionados aos medicamentos

34

24,46

24

17,27

81

58,27

Identifica medicamentos preparados que serão armazenados

10

7,2

13

9,35

116

83,45

Orientação Certa

Esclarece as dúvidas da prescrição junto ao prescritor

5

3,59

4

2,88

130

93,53

Orienta o paciente e/o acompanhante sobre os medicamentos

11

7,91

27

19,43

101

72,66

Resposta Certa

Avalia se o medicamento apresentou o efeito desejado

1

0,72

21

15,1

117

84,18

Informa os efeitos diferentes do esperado

11

7,91

23

16,55

105

75,54

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

Dos 139 profissionais participantes, emergiram 112 sugestões de estratégias para aumentar a segurança relacionada a administração de medicamentos sendo as principais estratégias sugeridas para a melhoria da assistência as relacionadas à atividade profissional (28; 25%), treinamentos (27; 24,1%) e tecnologias de barreiras (18; 16,07%), conforme apresentado na Tabela 4.

Tabela 4: Estratégias sugeridas pelos profissionais para aumentar a segurança na administração de medicamentos. Rio de Janeiro, Brasil, 2020. (n=112)

Estratégias sugeridas

   N                %

Atividades profissionais

28

25,00

Treinamentos

27

24,10

Inserir tecnologias de barreiras

18

16,07

Protocolos e padronizações

10

8,93

Atuação e dimensionamento de profissionais

9

8,04

Relativas à atuação da farmácia

8

7,14

Gerenciais

8

7,14

Estruturais

4

3,58

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

Dentre as estratégias sugeridas na categoria “Atividades profissionais” emergiram questões relacionadas a necessidade de padronização de protocolos pela instituição; implementação da dupla checagem da prescrição;  implementação de identificação do paciente alérgico na folha de prescrição; colocar pacientes homônimos em leitos distantes; evitar rotinas mecanizadas; adotar uma comunicação efetiva entre o prescritor e o profissional que administra o medicamento; informar ao paciente a medicação que será administrada incluído em um projeto terapêutico; e implementar de forma sistematizada a conferência das validades dos medicamentos.

Na categoria “Treinamentos” as principais sugestões foram relativas a treinamento/educação permanente da equipe bem como treinamento sobre o uso de equipamentos como bombas infusoras.

A categoria “Inserir tecnologias de barreias” apresentou sugestões relacionas ao uso de cores diferentes para a identificação os medicamentos, instalação de dispositivos sinalizador nas salas de preparo de medicação com o objetivo de evitar interrupções, implementar prontuários, aprazamentos eletrônicos e prescrições digitalizadas com o objetivo de minimizam os erros de compreensão referentes aos medicamentos, utilizar software que no ato da prescrição apresente um "travamento" impossibilitando que o prescritor prescreva doses inadequadas ou medicamentos caso o paciente apresente alergia, e também a sinalização/ identificação de medicamentos potencialmente perigosos.

DISCUSSÃO

De acordo com as respostas analisadas todas as variáveis geradoras de riscos relacionadas aos medicamentos obtiveram uma elevada frequência de resposta positiva, todas com mais de que 60%. O que demonstram uma preocupação dos profissionais com a segurança do paciente durante a administração de medicamentos, a eficácia da política de segurança do paciente na instituição e traduz as boas práticas na etapa de administração de medicamentos adotadas pelos profissionais participantes.

Em contrapartida a pesquisa evidenciou que as respostas negativas traduzem-se como fatores de risco e demonstram a necessidade de monitorização contínua da assistência sob a ótica do risco, e a necessidade de incorporação de princípios que visam a redução dos erros humanos, bem com a identificação da natureza dos erros, e das fragilidades relativas a assistência em saúde como forma de direcionar ações para a sua prevenção.4

Conforme evidenciado nos resultados, a variável que apresentou maior resposta positiva (98,00%) foi a relacionada à confirmação da via na prescrição pelos profissionais. Essa boa prática corrobora com outros estudos de adesão próxima a 100%. Essa ação aumenta a segurança na terapia medicamentosa e evita à ocorrência de eventos adversos graves, a falha na checagem da via é responsável por uma elevada taxa dos eventos adversos na etapa de administração medicamentosa.7-8

Outra variável com resposta positiva próxima a 100,00% foi a relativa a conferência do nome do medicamento que apresentou de respostas positivas superior a 96,00%. Essa ação corrobora com o protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamento preconizado pelo Ministério da Saúde e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).¹

Um estudo observou que a maioria dos erros envolvendo a administração do medicamento estão relacionados à não conferência do medicamento e aglomeração de vários tipos de fármacos em única bandeja, o que possibilita a troca dos mesmos no momento da administração.7 Esses dados vão ao encontro a variável geradoras de riscos analisada, pois aborda a forma individualizada que o medicamento deve ser administrado. A variável “leva o medicamento de forma individual” apresentou 90,65% de respostas positivas, o que corrobora com as boas práticas de segurança medicamentosa.¹

Outro ponto importante no que diz respeito a erros relativo à conferência do medicamento certo perpassa por questões de sobrecarga de trabalho, dimensionamento inadequado dos profissionais, fatores dispersivos no ambiente laboral, disposição de insumos e ausência de um planejamento da assistência de enfermagem, o que por sua vez pode vir a desencadear erros.7

Uma revisão sistemática, realizada sobre a temática, aponta alguns fatores que podem contribuir para a ocorrência de incidentes na etapa de administração de medicamentos como: comunicação verbal insuficiente, escrita de maneira ineficiente; confusão referente ao nome da medicação com por prefixo ou sufixo e termo semelhante; rotulagem confusa, erros de grafia, rótulos de produtos diferentes com aspecto semelhantes a outros produtos; déficit de conhecimento; erro de cálculo da dosagem ou velocidade de infusão, armazenamento, preparação, erro de transcrição, stress, fadiga, necessidade de dormir, comportamento intimidatório ou conflituosos.9 Muitos desses fatores também aparecem, na análise desta pesquisa, como condições geradoras de risco, o que corrobora e traz robustez para os resultados apresentados.

Destaca-se que, a variável com maior frequência de resposta negativa foi a ordem verbal somente em emergência (12,00%) demonstrando que rotineiramente essa prática ocorre na instituição participante da pesquisa, o que por sua vez vai contra as orientações do protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamento preconizado pelo Ministério da Saúde e ANVISA.4

Recomenda-se que as prescrições verbais devam ser restritas às situações de urgência/emergência, sendo imediatamente escrita na prescrição e que quando ocorrerem devem ser absolutamente necessárias e o prescritor deverá dizer o nome do medicamento bem com a dose e a via de forma clara, em seguida o profissional que receber a ordem verbal deverá repetir de volta o que dito para que o prescritor confirme antes da administração.4

A segunda variável com maior frequência de respostas negativas foi referente a identificação de alergia de forma diferenciada totalizando mais de 6% das respostas negativas foi um dado que chamou atenção, pois sabe-se que é fundamental verificar se o medicamento em mãos corresponde ao descrito em prescrição antes de ser administrado. É essencial checar alergias e identificar o paciente com pulseira diferenciada, registrar em prontuário e alertar a equipe multiprofissional.4

Com relações ao processo de administração, a variável com maior frequência de resposta positiva foi relativa à conferência atenta da dose prescrita apresentando frequência superior as 98,00%. Essa elevada frequência relatada demonstra a preocupação dos profissionais em realizar a medicação na dose prescrita.

Em contrapartida, uma pesquisa realizada com o objetivo de identificar o perfil de erros cometidos durante o preparo da medicação evidenciou que 23,40% dos erros cometidos estavam associadas a doses preparadas de forma errada. Dessa forma para que a equipe de enfermagem administre a medicação na dosagem correta é fundamental que o profissional conheça o medicamento, saiba realizar o cálculo da medicação de acordo com o peso e atente para a dosagem de medicamentos potencialmente perigosos.10

A variável relacionada à conferência do gotejamento e a programação das bombas de infusão apresentou frequência de respostas positivas superior a 97,00%. As bombas de infusão visam melhorar a precisão das infusões intravenosas, pois permitem um controle rigoroso das soluções. Porém, o manuseio inadequado desta tecnologia pode acrescer um risco ao paciente, enquanto o objetivo principal é aumentar a segurança. Em suma, pode-se inferir que tal tecnologia pode auxiliar na administração de medicamentos, contudo, não exclui a possibilidade da ocorrência de erros.11

A variável relacionada ao processo de medicamento, com maior frequência de resposta negativa (24,00%) foi relativa à notificação dos eventuais incidentes relacionados aos medicamentos.

Um outro estudo demonstrou que 70,10% dos erros não são notificados pelos profissionais da equipe de enfermagem, por temerem as possíveis punições. O que demonstra que a questão da notificação ainda está atrelada a cultura punitiva, sendo fundamental salientar que o erro de medicação é uma questão multiprofissional e que envolvem diversas questões, não devendo ser limitado a uma categoria profissional.12-13

A notificação de incidentes é um importante instrumento relativo à segurança. Estudos apontam que na prática a subnotificação de incidentes é elevada, pois os profissionais relatam a falta de feedback, apresentam incerteza sobre o que notificar e principalmente pela cultura punitiva no contexto dos serviços de saúde.12-13

A variável relacionada à devolução à farmácia das sobras dos medicamentos apresentou respostas negativas superior a 23,00% demonstrando que um número significativo de profissionais mantém em suas unidades sobras de medicamentos o que pode oportunizar a ocorrência de erros. As devoluções de medicamentos devem ocorrer nos casos de alta, transferência, substituição do fármaco, alteração da prescrição medicamentosa, óbito, solicitação em excesso. É fundamental que o setor tenha uma rotina a fim de manter um controle adequando das devoluções garantindo uma maior segurança medicamentosa, redução de custo e melhora de indicadores assistenciais.14

De maneira geral estima-se que falhas são possíveis de acontecer em todas as fases do processo e possuem o potencial de atingir o paciente. A implementação de estratégias simples e de baixo custo, de maneira a reorganizar os processos de trabalho e de práticas profissionais, por exemplo a checagem dos “nove certos” como medida de barreira no preparo de administração de medicamentos.15

Sabe-se que uma parte dos erros relacionados à medicação refletem em consequências graves aos pacientes. Visto isso, é de suma importância que tais eventos sejam devidamente notificados, estudados e que a responsabilidade seja compartilhada entre os profissionais e a instituição, que por sua vez deve prever e oferecer condições adequadas de trabalho para sua equipe, com o objetivo de prevenir sua recorrência, evitar danos e fortalecer um sistema seguro de administração de medicamentos.16

Além da notificação, outras estratégias foram sugeridas pelos profissionais da pesquisa e são apontadas na literatura como importantes para aumentar a segurança na administração de medicamentos. O treinamento foi uma das estratégias mais sugeridas (24,10%) pelos profissionais desse estudo. A capacitação da equipe de enfermagem é fundamental para o aperfeiçoamento das habilidades dos profissionais e mostra-se necessária não somente em relação ao aprendizado de habilidades e destrezas, mas, sobretudo, de um aprendizado que gere novas atitudes, soluções, ideias, conceitos e tomada de decisão.17

Destaca-se que de forma geral, as estratégias são simples e possíveis de serem implementadas a fim de tornar uma barreira de segurança na administração de medicamentos: durante a prescrição e dispensação de medicamentos, o uso de sistemas eletrônicos e computadorizados para checagem e conferência de medicamentos, incluindo potenciais interações medicamentosas é como uma nova tecnologia que pode contribuir para aumentar a precisão e diminuir as falhas nos processos de medicação. No entanto, é preciso ter cautela, sensibilizar os profissionais a respeito da importância dessa medida para a segurança do paciente, fornecer treinamento adequadamente os profissionais para o uso correto do recurso tecnológico.15

As principais vantagens da prescrição eletrônica: garantia de legibilidade e de adequação das informações necessárias para a dispensação e para a administração de medicamentos de forma segura. Os sistemas de prescrição eletrônica permitem também acoplar ferramentas em apoio à decisão clínica como alertas de doses máximas para medicamentos potencialmente perigosos/alta vigilância e/ou com índice terapêutico estreito; interações medicamentosas clinicamente significativas; alergias; apresentações e concentrações padronizadas disponíveis na instituição.15

Outra estratégia é empoderar pacientes, familiares e cuidadores para que participem ativamente nas decisões relacionadas aos seus cuidados em saúde, fazendo perguntas, o que pode favorecer a identificação de erros e gerenciamento do cuidado, afinal a etapa de administração é a última barreira de prevenção.4

É fundamental ressaltar que o resultado da presente pesquisa é fruto de respostas dos participantes a um formulário estruturado e validado o que por sua vez demonstra uma fragilidade relativa à necessidade de agradar ao pesquisador, trazendo respostas próximas a uma assistência alinhadas à boa prática. O produto demonstrou uma assistência segura através da visão do profissional à sua prática assistencial. Embora pesquisa tenha identificado fatores de risco relativos à etapa de administração de medicamentos, os pontos positivos apresentados favorecem um ambiente propício para a implantação de boas práticas.

CONCLUSÃO

Após análise, a administração de medicamentos realizada pelos profissionais da pesquisa foi classificada como segura visto que as respostas positivas em sua maioria foram superiores a 60,00%. As variáveis da pesquisa que obtiveram mais respostas positivas foram: confirma a via na prescrição; confere o nome do medicamento; e por fim confere o nome do medicamento com frequência próxima a 100,00%.

Já com relação as respostas negativas, as principais foram: ordem verbal somente em emergência; identifica a alergia de forma diferenciada; notifica os eventuais incidentes relacionados aos medicamentos; devolve à farmácia as sobras dos medicamentos.

As principais estratégias de barreiras que foram elencadas pelos profissionais a fim de aumentar a segurança na administração de medicamentos foram relativas.

Acredita-se que a principal limitação do estudo tenha sido com referente a obtenção da meta calculada inicialmente para a amostra que devido à Covid-19 que por sua vez impossibilitou o estabelecimento de uma abordagem mais próxima dos participantes, bem como o questionário muitas vezes não refletir a realidade, uma vez que os profissionais podem responder algo que não realiza em sua prática assistencial embora faça parte das atividades de enfermagem de modo a agradar o pesquisador.

Espera-se que os resultados obtidos subsidiem para gerar uma melhor prática de enfermagem, bem como para geração de indicadores para a gerência de enfermagem, com de elaborar estratégias através das fragilidades que emergiram, possibilitando uma assistência mais segura no que tange o processo de administração de medicamentos.

REFERÊNCIAS

1 Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Documento de referência para o Programa Nacional de Segurança do Paciente. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/documento_referencia_programa_nacional_seguranca.pdf

2 Thalyta CAT, Silvia HBC. Root cause analysis of falling accidents and medication errors in hospital. Acta Paul. Enferm. (Online). 2014;27(2):100-7. DOI: https://doi.org/10.1590/1982-0194201400019

3 World Health Organization (WHO). Medication without harm: WHO's Third Global Patient Safety Challenge. Genebra: World Health Organization; 2017. Available from https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/255263/WHO-HIS-SDS-2017.6-eng.pdf?sequence=1&isAllowed=y

4 Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Anexo 03: protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos. Brasília (DF): Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2013. Disponível em: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/protocolo-de-seguranca-na-prescricao-uso-e-administracao-de-medicamentos/

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Recebido em: 24/01/2021

Aceito em: 11/02/2022

Publicado em: 11/03/2022



[1] Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ). Brasil (BR). E-mail: fcamerini@gmail.com ORCID: 0000-0002-4330-953X

[2] Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ). Brasil (BR). E-mail: juliane_lage@hotmail.com ORCID: 0000-0003-2776-9912

[3] Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ). Brasil (BR). E-mail: cintiafassarella@gmail.com ORCID: 0000-0002-2946-7312

[4] Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ). Brasil (BR). E-mail: danimendh@gmail.com ORCID: 0000-0002-2946-7312

[5] Ministério da Saúde (MS), Brasília (DF). Brasil (BR). E-mail: dezza.franco@gmail.com ORCID: 0000-0001-5008-1345

 

Como citar: Camerini FG, Lage JSL, Fassarella CS, Henrique DM, Franco AS. Avaliação da administração de medicamentos: identificando riscos e implementando barreiras de segurança. J. nurs. health. 2022;12(1):e2212120501. Disponível em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/view/20501





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