Casarin ST, Porto AR, Gabatz RIB, Bonow CA, Ribeiro JP, Mota MS. Tipos de revisão de literatura: considerações das editoras do Journal of Nursing and Health. J. nurs. health. 2020;10(n.esp.):e20104031
https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/view/19924
EDITORIAL
Tipos de revisão de literatura: considerações das editoras do Journal of Nursing and Health
Types of literature review: considerations of the editors of the Journal of Nursing and Health
Tipos de revisión de la literatura: consideraciones de los editores de Journal of Nursing and Health
Casarin, Sidnéia Tessmer[1]; Porto, Adrize Rutz[2]; Gabatz, Ruth Irmgard Bartschi[3]; Bonow, Clarice Alves[4]; Ribeiro, Juliane Portella[5]; Mota, Marina Soares[6]
As Revisões de Literatura (RL) são estudos que visam fazer uma síntese da literatura ou identificar o estado da arte sobre determinado assunto,1-5 bem como conhecer quais as lacunas sobre ele. Didaticamente, costuma-se ver as RL sendo divididas em sistematizadas (integrativa e sistemática) ou não (narrativa), e refletem a maior parte das submissões que o Journal of Nursing and Health (JONAH) recebe para avaliação. Sendo assim, as editoras do JONAH consideram importante comentar a respeito de alguns pontos frente aos conceitos e detalhes que permeiam as submissões de RL na revista.
A Revisão Narrativa (RN) é uma forma não sistematizada de revisar a literatura. É importante para buscar atualizações a respeito de um determinado assunto dando ao revisor suporte teórico em curto período. Também pode ser útil na descrição do estado da arte de um assunto específico, sob o ponto de vista teórico ou contextual. Como a RN inclui um processo mais simplificado de revisar a literatura, a questão de pesquisa pode ser mais ampla ou pouco específica e abordar um tema de forma livre, sem rigor metodológico e por isso está sujeita aos vieses. Na RN não há obrigatoriedade de que os autores informem com detalhes os procedimentos ou critérios usados para selecionar e avaliar as referências incluídas na análise, pois a forma de seleção é variável e arbitrária.2-4
Em relação às revisões sistematizadas, destaca-se a aclamada Revisão Sistemática (RS). Ela é um estudo retrospectivo com dados secundários e objetiva sintetizar evidências sobre um problema/tema específico analisando publicações com dados primários de pesquisa. É indicada quando: o problema/ tema é controverso ou possui muitas publicações; visa identificar a terapêutica/intervenção/grupos clínicos (prática baseada em evidências) ou quer fazer uma comparação entre achados da pesquisa clínica. O método é rígido e deve ser explícito e reproduzível para que se possa fazer uma busca sistematizada das publicações.6-10
Como a RS exige um método rígido para o seu desenvolvimento, é necessário que um protocolo seja desenvolvido e cumprido com rigor, sendo que os principais pontos incluem: a elaboração da questão de pesquisa; a definição das fontes de dados (bases e bibliotecas eletrônicas) e estratégia de busca; o estabelecimento dos critérios de seleção dos estudos; a condução da busca dos estudos; a comparação entre os estudos encontrados; a aplicação dos critérios de seleção e justificativa das exclusões; a análise crítica e avaliação da qualidade dos estudos (metodológica e nível de evidência); o preparo do resumo crítico (síntese das informações) e a conclusão, indicando as evidências científicas localizadas.2,6-8,10 Ainda alguns procedimentos, para a realização da RS são indicados como importantes, dentre eles: a verificação de duplicidade de publicações, o registro do protocolo da revisão e a observação aos critérios protocolados em guias internacionais como o Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) e Meta-analysis Of Observational Studies in Epidemiology (MOOSE).10
Na RS há indicação de que a elaboração da pergunta de pesquisa seja criteriosa, uma vez que esta é considerada a base da revisão. Os itens considerados fundamentais para isso são: População (participantes ou problema/situação clínica); Intervenção; Comparação/Controle e Outcomes (desfechos ou resultado esperado) o que é comumente descrito nas publicações a partir do acrômio ‘PICO’.11-12
Outra forma de sistematizar a RL é pela Revisão Integrativa (RI). Essa é reconhecida como um método de pesquisa desde a década de 1980. A RI visa reunir (integrar) achados de trabalhos empíricos e teóricos, permitindo sintetizar resultados e aprofundar a compreensão sobre um fenômeno específico, com respeito à filiação epistemológica dos trabalhos incluídos. Também é uma forma sistematizada de realizar a RL, pois deve respeitar um método rigoroso de busca, análise e síntese dos dados, permitindo tomada de decisão frente à determinado problema, a fim de qualificá-lo.5,10,12-15
A RI didaticamente pode ser dividida em metodológica, teórica e empírica. A forma metodológica visa a revisão crítica e a análise de desenhos e metodologias de diversos estudos; na teórica, o foco são as teorias sobre um tema particular e a RI empírica foca nos estudos empíricos quantitativos e/ou qualitativos sobre um tema particular.8 Contudo, considera-se que quando forem inclusas apenas pesquisas primárias seja utilizado outro tipo de revisão como a sistemática, por exemplo.10
Comumente, o processo metodológico para a realização da RI é descrito em seis etapas. A primeira envolve a escolha e a definição do tema, a elaboração da questão de pesquisa, os objetivos e a identificação das palavras-chaves/descritores. A segunda etapa integra o estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão das publicações, a busca nas fontes de dados, a organização do banco de referências e a seleção dos estudos que irão compor o corpus de análise. A terceira etapa realiza a extração dos dados para a organização e sumarização das informações pertinentes à montagem do banco de dados. A quarta etapa envolve a análise crítica dos estudos incluídos (avaliação). A quinta etapa realiza a interpretação e a discussão dos resultados com proposta de recomendações e sugestões para novas pesquisas. E a sexta (última etapa) constitui a apresentação dos resultados da revisão (síntese do conhecimento).5,12,14-15
Reforça-se que a elaboração da questão de pesquisa faz parte da primeira etapa e deve ser pensada de forma criteriosa, porém publicações classicamente utilizadas para ancorar o processo não citam a utilização do acrômio PICO.8,14-15 O uso dessa estratégia tem sido uma decisão individual da equipe que está realizando a RI, mas atualmente, em publicação na área da enfermagem feita no ano de 20195, foi orientado a sua utilização como estratégia para a elaboração da questão de pesquisa. Destaca-se que, essa mesma publicação, além do acrômio classicamente utilizado, também cita outros, como PICOT (onde T significa ‘Time’/período) ou PICOS (onde S significa ‘Study time’/período do estudo).5 Contudo, cabe ressaltar que além dessas indicações, na RI, encontram-se trabalhos que utilizam outras combinações mnemônicas para formular a questão de pesquisa, dentre elas a PCC (P: Population/população; C: Concept/conceito e C: Context/contexto).16
Outra questão importante a ser destacada é a avaliação da qualidade metodológica e das fontes primárias dos estudos que serão inseridos no corpus final da análise e que irão compor o relatório final da RI. A quarta etapa, das seis comumente seguidas, aborda a análise crítica dos estudos, sendo nela que o processo de avaliação metodológica se faz necessário.10 Ainda, encontra-se indicação, na quarta etapa da RI, da realização da avaliação do nível de evidência das publicações selecionadas, assim como na RS, a fim de assegurar a prática baseada em evidência.14 Nesse sentido, questiona-se a real necessidade desta avaliação, pois a classificação do nível de evidência determina que apenas estudos de natureza quantitativa representam algum grau de qualidade para a prática baseada em evidência, desconsiderando as pesquisas qualitativas, que são objetivo da RI.17
Também cabe mencionar a importante contribuição que o uso de softwares para gerenciamento das referências bibliográficas de tem tido na construção de artigos acadêmicos. No processo de RL, essas ferramentas atuam na organização das publicações provenientes das buscas, o que repercute positivamente na qualidade final do processo de revisão.5 Mesmo que seja possível fazer uma RL sem se utilizar desses recursos tecnológicos, considera-se que seu emprego é essencial, uma vez que identifica facilmente duplicatas, organiza as obras e facilita as citações.
Ainda, existem outras formas de realizar uma RL, sendo que é comum encontrar outras variações ao se pesquisar as publicações da área da saúde, dentre elas evidenciam-se a: Scoping Review (ScR), a Rapid Review (RR), a Mixed Studies Review (MSR) ou Revisão de estudos mistos; e a Mapping Review (MR).
O ScR é uma nova abordagem para revisar a literatura sobre um determinado tema. Pode ser utilizado para mapear a literatura existente em áreas de interesse a fim de verificar qual a natureza, as características da pesquisa primária e a quantidade de publicações existentes. Empregada para assuntos complexos, com poucos estudos de revisão e que apresentam resultados distintos (heterogêneos). O ScR também é útil para identificar lacunas na literatura e ser etapa preliminar para a RS (ou verificar se é necessária). Enfatiza-se que a ScR não visa avaliar a qualidade das evidências disponíveis e não há uma definição universal para esse tipo de estudo, nem um procedimento definido, contudo há uma extensão do guia internacional PRISMA Extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR) que aborda itens relevantes na construção do ScR.10,18-20
A RR visa fornecer informações mais rápidas para tomada de decisão em comparação às revisões sistemáticas. É usada quando é necessário acelerar o processo de RS, omitindo estágios e deixando-a, assim, menos rigorosa. Deve ser aplicada quando: os tópicos de pesquisa forem novos ou emergentes; quando são necessárias atualizações de análises anteriores; para avaliar o que já é conhecido sobre uma política ou prática, usando alguns métodos de RS e também, ainda, para a revisão de tópicos críticos.21
A MSR examina estudos de métodos mistos quanti e/ou qualitativos. Pode combinar e integrar de formas diferentes os diversos tipos de estudos primários (estudos qualitativos, quantitativos-observacionais, quantitativos-experimentais e de métodos mistos) e assim fornecer uma visão mais completa sobre um determinado fenômeno que apresente um grau maior de complexidade e ainda propor intervenções. Contudo, há dificuldades em objetivar diretrizes para sua elaboração ou revisão, destacando-se a iniciativa do Joanna Briggs Institute.10,22-23
Já na MR é realizada uma síntese visual da literatura. Ela deve ser utilizada quando há abundância e diversidade de pesquisas, como primeiro passo para uma RS; para identificar lacunas em uma área de tópico. Também pode ser limitada a um certo tipo de artigo ou a apenas artigos de revisão, periódicos revisados por pares ou pesquisa em literatura cinzenta.24
Ainda, é importante fazer considerações sobre a metanálise e a metassíntese, também comumente encontradas nas publicações relacionadas às revisões de literatura. Evidencia-se que para a realização de ambas, anteriormente é necessário um processo de revisão sistematizada da literatura.
A metanálise é descrita como a análise da análise e visa produzir uma única estimativa ou índice que caracterize o efeito de determinada intervenção. Pode ser utilizada para estudos clínicos ou observacionais. Para isso, utiliza-se métodos estatísticos para agrupar os resultados de dois ou mais estudos que apresentem a mesma condição clínica, intervenção e desfechos avaliados. Uma metanálise deve ser proveniente de uma revisão sistemática e pode ser capaz de fornecer estimativas mais precisas do efeito de uma determinada intervenção, aumentando sua confiabilidade, poder estatístico e a precisão da estimativa do efeito do tratamento.7-8, 10
As metassínteses, metaestudos e as metaetnografias também objetivam fazer uma análise da análise, assim como a metanálise, contudo elas analisam criticamente estudos primários qualitativos e sintetizam os achados em uma nova teoria ou em um quadro geral sobre o tópico de interesse. Optar por metassínteses, metaestudos e as metaetnografias irá depender do tipo de estudo qualitativo que será revisado, sendo que cada uma possui algumas particularidades quanto ao método.10,13
Considera-se as revisões de literatura como pesquisas importantes e essenciais na enfermagem. Ressalta-se a relevância de se investir na qualidade das revisões, independentemente do tipo que os pesquisadores escolham. É fundamental observar os detalhes inerentes às diversas etapas de construção das revisões, para que assim, seja possível responder com confiabilidade os objetivos aos quais se destinam.
REFERÊNCIAS
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[1] Enfermeira. Doutora em Ciências. Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Rio Grande do Sul (RS), Brasil. E-mail: stcasarin@gmail.com http://orcid.org/0000-0001-8190-1318
[2] Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Rio Grande do Sul (RS), Brasil. E-mail: adrizeporto@gmail.com http://orcid.org/0000-0002-5616-1626
[3] Enfermeira. Doutora em Ciências. Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Rio Grande do Sul (RS), Brasil. E-mail: r.gabatz@yahoo.com.br https://orcid.org/0000-0001-6075-8516
[4] Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Rio Grande do Sul (RS), Brasil. E-mail: claricebonow@gmail.com https://orcid.org/0000-0001-9918-9234
[5] Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Rio Grande do Sul (RS), Brasil. E-mail: ju_ribeiro1985@hotmail.com https://orcid.org/0000-0002-1882-6762
[6] Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Rio Grande do Sul (RS), Brasil. E-mail: msm.mari.gro@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-5717-9406
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