ARTIGO ORIGINAL

Prevalência de violência contra a mulher e suas repercussões na maternidade

Prevalence of violence against women and its repercussions in maternity

Prevalencia de la violencia contra la mujer y sus repercusiones en la maternidad

Rodrigues, Priscila Alberton[1]; Cicolella, Dayane de Aguiar[2]; Mariot, Márcia Dornelles Machado[3]

RESUMO

Objetivo: verificar a prevalência de violência contra a mulher e as suas repercussões no processo de maternidade. Método: estudo transversal, realizado no alojamento conjunto de um hospital da região metropolitana de Porto Alegre com 175 mulheres. Resultados: observou-se no estudo que maioria das entrevistadas já vivenciaram algum tipo de violência ao longo da vida (79,2%) e (23,7%) delas, durante o período gestacional. Destaca-se que o principal agressor na maioria dos casos foi o companheiro (47,9%) e que elas relataram que o fato de terem sofrido violência poderá influenciar nos cuidados com seu filho. Conclusões: ter sofrido violência não influenciou na decisão da maioria das entrevistadas de serem mães, mas, sim, na propensão aos cuidados excessivos com seu filho.

Descritores: Saúde da mulher; Gravidez; Violência; Relações materno-fetais

ABSTRACT

Objective: to verify the prevalence of violence against women and its repercussions on the maternity process. Method: cross-sectional study carried out in the joint accommodation of a hospital in the metropolitan region of Porto Alegre with 175 women. Results: it was observed in the study that most of the interviewees have already experienced some type of violence throughout their lives (79.2%) and (23.7%) of them, during the gestational period. It is noteworthy that the main aggressor in most cases was the partner (47.9%) and that they reported that the fact of having suffered violence may influence the care for their child. Conclusions: having suffered violence did not influence the decision of the majority of the interviewees to be mothers, but, rather, the propensity for excessive care for their child.

Descriptors: Women's health; Pregnancy; Violence; Maternal-fetal relations

RESUMEN

Objetivo: verificar la prevalencia de la violencia contra la mujer y sus repercusiones en el proceso de maternidad. Método: estudio transversal realizado en el alojamiento conjunto de un hospital de la región metropolitana de Porto Alegre con 175 mujeres. Resultados: se observó en el estudio que la mayoría de las entrevistadas ya ha experimentado algún tipo de violencia a lo largo de su vida (79,2%) y (23,7%) de ellas, durante el período gestacional. Es de destacar que el principal agresor en la mayoría de los casos fue la pareja (47,9%) y que informaron que el hecho de haber sufrido violencia puede influir en el cuidado de su hijo. Conclusiones: el haber sufrido violencia no influyó en la decisión de la mayoría de las entrevistadas de ser madres, sino más bien en la propensión al cuidado excesivo de su hijo.

Descriptores: Salud de la mujer; Embarazo; Violencia; Relaciones materno-fetales

INTRODUÇÃO

A violência pode ser conceituada como uso de força física ou abuso de autoridade, reprimindo, constrangendo como por uso de ameaças, podendo ocorrer consigo, contra outro indivíduo, conjunto de pessoas ou comunidade, que este contato acarrete qualquer tipo de dano físico, psicológico e moral.1

Esta problemática é uma violação dos diretos das mulheres e de grande importância na saúde pública no Brasil. Cabendo destacar que a referida violação, na maioria das vezes, é realizada por homens, do meio social da mulher caracterizando-se, portanto, como violência doméstica.2

Dentre os tipos de violência, está a violência contra a mulher que subdivide- se em sexuais, psicológicas e patrimonial. Cabe ressaltar que, na maioria das vezes, a violência é realizada por indivíduos muito próximo, quase sempre por familiares, da vítima.3

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2016, o Brasil ocupava o 5º lugar no ranking mundial dos países mais violentos contra as mulheres mesmo diante de leis criadas especialmente para este fim, como por exemplo, a Lei Maria da Penha. A referida lei foi instituída no dia 6 de agosto de 2006, com o objetivo principal de reduzir e prevenir os casos de violência contra as mulheres.  Contudo, mesmo com criações de leis para auxiliar na busca de equidade dos sexos, ainda persiste uma cultura machista, culpabilizando a mulher em virtude do ato infringido pelo autor.4

A violência contra a mulher advém de um contexto histórico, uma vez que na pré-história ela só tinha um papel, de procriação e cuidados com os filhos, e o homem, era o responsável pela caça e detinha completa autoridade.5 E a violência continuava presente no decorrer da história, nos tempos feudais as mulheres não podiam ter opinião, eram castigadas forçadas a o uso de cinto de castidade, e as que o faziam eram queimadas como bruxas.5 No Brasil Imperial as mulheres cumpriam pena se cometessem adultério, mesmo sendo vítimas, conhecido como crime de paixão.5

A dominação masculina é histórica, foi imposta e vivida como modelo por excelência, resultando em violência simbólica, violência essa que passa despercebida, muitas vezes, até pelas próprias vítimas. A detecção da violência normalmente ocorre por vias simplesmente simbólicas da verbalização e do conhecimento dos sentimentos da mesma.6 Contudo, mesmo tendo conhecimento dos fatos, não conseguem, exercer mudanças que, na prática, as afastem da situação de violência. Um dos locais mais visíveis deste comportamento é dentro da unidade familiar.6

Este estudo se justifica devido a importância de detectarmos os principais tipos de violência presentes na gestação a fim de identificarmos e auxiliar-nos no processo de enfrentamento das situações de violência doméstica no período gestacional.

Verificar, nesse contexto, a importância do auxílio e do acolhimento por parte dos profissionais, considerando que a mulher durante o período gestacional se encontra mais frágil emocionalmente e necessitando de cuidados específicos. Reconhecer em um primeiro momento as dificuldades e medos desta gestante, nesse período, é fundamental. O presente estudo teve por objetivo verificar a prevalência de violência contra a mulher e as suas repercussões no processo de maternidade.

MATERIAIS E MÉTODO

Estudo quantitativo do tipo transversal, realizado em um hospital da região metropolitana de Porto Alegre sob a gestão da Fundação Universitária de Cardiologia, sendo uma unidade hospitalar que presta serviço exclusivamente para o Sistema Único de Saúde. Contando com centro obstétrico e maternidade, tendo como média de 130 internações mês. A pesquisa foi realizada no alojamento conjunto que conta com 23 leitos destinados à internação de mulheres no período puerperal e gestacional de risco. A equipe era composta por uma enfermeira, três técnicos de enfermagem a cada turno de trabalho e um pediatra neonatologista, um ginecologista na assistência diária e plantão para emergências.

Os critérios de inclusão foram gestantes e puérperas internadas na unidade de alojamento conjunto. O processo de exclusão se deu para mulheres menores de 18 anos, reinternações. O cálculo do tamanho da amostra, embasado em um estudo e 20157 e foi realizado no programa WinPEPI (Programs for Epidemiologists for Windows) versão 11.43. Considerando um nível de confiança de 95%, uma população anual estimada em 1.100 pacientes (excluindo em torno de 40%, considerando adolescentes, reinternação e internadas que não aceitarem participar da pesquisa), uma prevalência de violência contra a mulher na vida estimada em 36,9% e margem de erro de 5%, obteve-se uma amostra de 175 mulheres.7

O estudo obteve aval ético e metodológico do Comitê de Ética em Pesquisa da CESUCA sob Certificado de Apresentação para Apreciação Ética número 27195819900005665. A coleta de dados ocorreu mediante questionário elaborado com perguntas fechadas que foi aplicado, pela pesquisadora, junto as mulheres internadas na unidade hospitalar no alojamento conjunto.

Foi aplicado o termo de consentimento livre esclarecido, em duas vias, antes do início da entrevista permanecendo uma via com o pesquisador e a outra com a entrevistada. Ele foi devidamente explicado para a paciente e, somente após a sua assinatura, o estudo teve seguimento.

RESULTADOS

A seguir serão apresentados os resultados sobre as 174 participantes incluídas no presente estudo. Referente ao perfil sociodemográfico, destaca-se que a idade materna média foi de 26,9 anos (DP± 6,7), a maioria das entrevistadas eram brancas, mantinham relacionamento estável com seus parceiros, tiveram um relacionamento conjugal ao longo da vida, haviam completado o ensino médio, não estavam trabalhando e possuíam uma renda familiar de dois a três salários-mínimos. Sobre o acompanhamento pré-natal, a maioria das mulheres haviam realizado mais de 6 consultas de pré-natal, estavam com uma idade gestacional entre 37 e 40 semanas e eram multíparas. Entre as puérperas, tiveram a presença do companheiro como acompanhante no trabalho de parto (Tabela 1).

Tabela 1: Aspectos sociodemográficos e do pré-natal das mulheres entrevistadas. Cachoeirinha (RS), Brasil, 2020. N=175

Variáveis

N (%)

Temporização

 

          Gestante

39 (22,3)

          Puérpera

136 (77,7)

Raça

 

          Branca

129 (73,7)

          Preta

13 (7,4)

          Parda

32 (18,3)

          Amarela

1 (0,6)

Escolaridade

 

          Fundamental Incompleto

25 (14,3)

          Fundamental Completo

18 (10,3)

          Médio Incompleto

38 (21,7)

          Médio Completo

79 (45,1)

          Superior Incompleto

10 (5,7)

          Superior Completo

5 (2,9)

Está trabalhando

 

          Sim

70 (40,2)

          Não

104 (59,8)

União estável

 

          Sim

139 (79,9)

          Não

35 (20,1)

Número de relacionamentos conjugais durante a vida

 

          1

82 (47,1)

          2

61 (35,1)

          3

22 (12,6)

          4 ou mais

9 (5,2)

Renda familiar (em salários-mínimos)

 

          Até 1

70 (40,2)

          2-3

89 (51,2)

          4 ou mais

15 (8,6)

Número de consultas pré-natal

 

          Menos que 6

36 (20,7)

          Mais que 6

138 (79,3)

Idade gestacional

 

          24 – 29 semanas

15 (8,6)

          30 – 35 semanas

23 (13,2)

          36 semanas

13 (7,5)

          37 – 40 semanas

90 (51,7)

          41 semanas ou mais

33 (19,0)

Paridade

 

          Multípara

94 (54,0)

          Primípara

80 (46,0)

Acompanhante no trabalho de parto

 

          Sim, companheiro

102 (58,3)

          Sim, outros

48 (27,4)

          Não

25 (14,3)

Fonte: dados da pesquisa, 2020.           

Na tabela 2, estão descritos os dados referentes ao histórico de violência das mulheres que participaram deste estudo, estratificados segundo o momento em que sofreram a violência e os vários subtipos dela. Cabendo destacar que a maioria das entrevistadas já vivenciaram algum tipo de violência ao longo da vida 137 (79,2%) e 41 (23,7%) delas, durante o período gestacional. A tabela 3 descreve a análise da interferência da violência na criação dos filhos.

Tabela 2: Histórico de violência das participantes do estudo. Cachoeirinha (RS), Brasil, 2020. N=175

Variáveis

N(%)

Patrimonial

48 (27,6)

Momento

 

          Antes da gestação

42 (87,5)

          Durante a gestação

6 (12,5)

Praticado por

 

          Companheiro

23 (47,9)

          Familiar de primeiro grau

8 (16,7)

          Outros

17 (35,4)

Moral

114 (65,9)

Momento

 

          Antes da gestação

78 (68,4)

          Durante a gestação

7 (6,2)

          Ambos os períodos

29 (25,4)

Praticado por

 

          Companheiro

59 (51,8)

          Familiar de primeiro grau

22 (19,3)

          Outros

33 (28,9)

Psicológica

93 (53,8)

Momento–

 

          Antes da gestação

65 (69,9)

          Durante a gestação

7 (7,5)

          Ambos os períodos

21 (22,6)

Praticado por

 

          Companheiro

49 (52,6)

          Familiar de primeiro grau

18 (19,4)

          Outros

26 (28,0)

Física

70 (40,5)

Momento

 

          Antes da gestação

52 (74,3)

          Durante a gestação

5 (7,1)

          Ambos os períodos

13 (18,6)

Praticado por

 

          Companheiro

44 (62,9)

          Familiar de primeiro grau

14 (20,0)

          Outros

12 (17,1)

Sexual

35 (20,2)

Momento

 

          Antes da gestação

33 (94,3)

          Durante a gestação

0 (0,0)

          Ambos os períodos

2 (5,7)

Praticado por

 

          Companheiro

9 (25,7)

          Familiar de primeiro grau

14 (40,0)

          Outros

12 (34,3)

Fonte: dados da pesquisa, 2020.


 

Tabela 3: Interferência da violência na criação dos filhos. Cachoeirinha (RS), Brasil, 2020.

Variáveis

N(%)

Influência na decisão de ser mãe (N=137)

 

          Sim

28 (20,4)

          Não

109 (79,6)

Motivação (N=28)

 

          Com um filho minha relação com o agressor melhoraria

10 (35,7)

          Teria coragem para acabar com as agressões

11 (39,3)

          Com a presença do filho as agressões terminariam

3 (10,7)

          Outros

4 (14,3)

Influência no cuidado com o filho (N=137)

 

          Sim

128 (93,4)

          Não

9 (6,6)

Tipo influência (N=128)

 

          Reduzir a afetividade com meu filho

3 (2,3)

          Ficar propensa cuidados excessos com meu filho

74 (57,8)

          Usar a violência como meio de educação

13 (10,2)

          Outros

38 (29,7)

Prejuízo para os filhos (N=128)

 

          Problemas psicológicos ao longo da vida

51 (39,8)

          Dificuldades na escola

9 (7,0)

          Rebeldia na adolescência

20 (15,6)

          Uso de álcool e drogas

36 (28,2)

          Outros

12 (9,4)

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

Com relação à idade, as mulheres que não sofreram violência tinham idade média de 26,9 anos (DP ± 6,7), enquanto aquelas que sofreram violência, possuíam 28 anos (DP ± 7,0). Não foi observada diferença estatística significativa para essa variável (p=0,865).

Observando a Tabela 4, a verificação da correlação das variáveis sociodemográficas e de pré-natal com a violência, encontrou-se associação, estatisticamente significativa, entre a ocorrência de violência, durante algum momento da vida, com o número de relacionamentos conjugais (p=0,008).

Tabela 4: Análise das variáveis sociodemográficas e de pré-natal com o histórico de violência. Cachoeirinha (RS), Brasil, 2020. N=175

Variáveis

Não sofreu violência
(N = 37)

Sofreu violência

(N= 138)

p-valor

Temporização – n (%)

 

 

0,276

          Gestante

5 (13,9)

33 (24,1)

 

          Puérpera

31 (86,1)

104 (75,9)

 

Raça – n (%)

 

 

0,663

          Branca

27 (75,0)

100 (73,0)

 

          Preta

4 (11,1)

9 (6,6)

 

          Parda

5 (13,9)

27 (19,7)

 

          Amarela

0 (0,0)

1 (0,7)

 

Nível de Escolaridade – n (%)

 

 

0,985

          Ensino Fundamental Incompleto

4 (11,1)

21 (15,3)

 

          Ensino Fundamental Completo

4 (11,1)

14 (10,2)

 

          Ensino Médio Incompleto

9 (25,0)

28 (20,4)

 

          Ensino Médio Completo

16 (44,4)

62 (45,4)

 

          Ensino Superior Incompleto

2 (5,6)

8 (5,8)

 

          Ensino Superior Completo

1 (2,8)

4 (2,9)

 

Empregada no presente momento – n (%)

 

0,684

          Sim

13 (36,1)

57 (41,6)

 

          Não

23 (63,9)

80 (58,4)

 

União estável – n (%)

 

0,194

          Sim

32 (88,9)

106 (77,4)

 

          Não

4 (11,1)

31 (22,6)

 

Quantos relacionamentos conjugais durante a vida – n (%)

 

0,008

          1

26 (72,2)

55 (40,2)

 

          2

7 (19,4)

54 (39,4)

 

          3

2 (5,6)

20 (14,6)

 

          4 ou mais

1 (2,8)

8 (5,8)

 

Renda familiar (em salários-mínimos) – n (%)

 

0,355

          Até 1

16 (44,4)

53 (38,7)

 

          2-3

19 (52,8)

70 (51,1)

 

          4 ou mais

1 (2,8)

14 (10,2)

 

Número de consultas Pré-Natal – n (%)

 

0,997

          Menos que 6

8 (22,2)

28 (20,4)

 

          Mais que 6

28 (77,8)

109 (79,6)

 

Idade gestacional – n (%)

 

0,068

          24 – 29 semanas

1 (2,8)

14 (10,2)

 

          30 – 35 semanas

3 (8,3)

20 (14,6)

 

          36 semanas

4 (11,1)

9 (6,6)

 

          37 – 40 semanas

16 (44,4)

73 (53,3)

 

          41 semanas ou mais

12 (33,4)

21 (15,3)

 

Paridade – n (%)

0,724

          Multípara

21 (58,3)

73 (53,3)

 

          Primípara

15 (41,7)

64 (46,7)

 

Acompanhante no trabalho de parto – n (%)

 

0,071

          Sim, companheiro

24 (75,0)

69 (66,4)

 

          Sim, outros

8 (25,0)

20 (19,2)

 

          Não

0 (0,0)

15 (14,4)

 

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

No teste de associação houve significância estatística entre sofrer violência na gestação e não ter união estável (p=0,006), sendo que a prevalência de violência na gestação mais que dobra nas mulheres que não estão em um relacionamento de união estável (Figura 1).

Figura 1: Associação entre união estável e sofrer violência na gestação Cachoeirinha (RS), Brasil, 2020.

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

DISCUSSÃO

O perfil sociodemográfico das  gestantes e puérperas incluídas no estudo, que eram em sua maioria brancas, média de idade de 26,9 anos, viviam com companheiro em união estável e possuíam o ensino médio completo, demostrou ser semelhante aos achados de um estudo realizado, no estado de Santa Catarina, o qual teve por objetivo analisar os fatores associados à violência contra a mulher, no qual aquelas que sofreram agressões eram majoritariamente brancas (83,6%), média de idade de 28,41 anos, casadas ou em união estável (45,0%) e possuíam Ensino Fundamental completo (60,6%).8

Neste estudo, a maioria das entrevistadas já vivenciou algum tipo de violência ao longo da vida e, em alguns casos durante o período gestacional. Dentre dos subtipos de violência analisados a mais prevalente foi a violência moral, seguida da psicológica e da física, cabendo ressaltar, que elas, na maioria das vezes, foram realizadas de forma associada, e que não seguem uma ordem de acontecimentos. Ademais, destaca-se que as supracitadas violências foram praticadas na maioria das vezes pelos companheiros das mulheres. Cabendo destacar que, no presente estudo encontrou-se, associação, estatisticamente significativa, entre a ocorrência de violência, durante algum momento da vida, com o número de relacionamentos conjugais.

Segundo estudo realizado com o objetivo de mapear a violência conjugal no Rio Grande do Sul, em relação à presença de coerção sexual, agressão física e psicológica, do qual participaram 751 casais, os autores encontraram uma elevada prevalência de violência acometida por ambos os parceiros e a idade, a escolaridade, a renda, bem como, o tempo de relacionamento demostraram estrarem correlacionados a violência conjugal. Os autores ressaltaram a importância de intervenções direcionadas aos casais que convivem em situação de violência.9

De acordo com os resultados encontrados nesta pesquisa, destacamos o papel da equipe de enfermagem de diagnosticar precocemente os casos de violência contra as mulheres, durante as consultas de pré-natal, a fim de minimizar os prejuízos causados na vida desta mulher e de seus filhos. Estudo descritivo de abordagem qualitativa, da cidade de Pesqueira, Pernambuco, possibilitou conhecer como o enfermeiro da estratégia de saúde da família reconhece, e combate o efeito da violência contra gestantes.10 O referido estudo demonstrou que grande parte dos profissionais apesar de já terem se deparado com esta temática em palestras e na graduação, possuem dificuldade de reconhecer os tipos de violência.10 Salienta-se, a partir do exposto, a importância de qualificar os profissionais, mediante educação permanente, para atuar nesses casos de violência contra as mulheres, especialmente, durante a gestação.

As principais estratégias utilizadas pelos enfermeiros para atender mulheres vítimas de violência, de acordo com Revisão Integrativa sobre ações desenvolvidas por enfermeiros em estratégia de saúde da família com mulheres vítimas violência doméstica, foram: as visitas domiciliares, o acolhimento, o estabelecimento de vínculo, a inclusão de perguntas e protocolos para identificação e assistência a estas vítimas.11

No presente estudo, a violência psicológica e a moral foram as mais frequentes no período gestacional e, em sua maioria, praticadas pelo companheiro. Dado este, que vai ao encontro dos achados do estudo de meta-análise realizado com mulheres que sofreram violência pelo parceiro íntimo durante a gravidez e problemas comportamentais de seus filhos, e que concluiu que a violência sofrida durante a gestação pode estrar associada a problemas comportamentais dos filhos, destacando a necessidade de maior entendimento sobre as questões de vulnerabilidade das crianças a diversidades precoces. Ademais, a chance de problemas internalizantes das crianças, expostas a violência pré-natal, foi duas vezes maior e de problemas externalizantes, foi 1,90 maior quando comparada com filhos de mães não expostas.12

Sobre a relação mãe e filho, a maioria das mulheres acreditam que ter sofrido violência influencia no cuidado com seu filho, uma vez que as tornariam propensas cuidados excessivos com ele. De forma complementar ao referido, sobre os prejuízo da violência para seus filhos, as respostas mais prevalentes foram problemas psicológicos ao longo da vida, seguido do uso de álcool e drogas, resultados estes, que corroboram com estudo que analisou a violência contra a mulher no contexto familiar nuclear: os reflexos da violência doméstica sobre os filhos, e concluiu que crianças expostas a quaisquer tipo de violência conjugal terão seu desenvolvimento prejudicado psicologicamente e socialmente, assim como, estarão mais propícias a reproduzir a violência em sua fase adulta em decorrência da naturalização da mesma. Também entre as consequências encontradas pelos pesquisadores do estudo supracitado estão os problemas emocionais/comportamentais e escolares.13

De acordo com estudo de caso, realizado com mulheres com histórico de pobreza e violência social com o objetivo destacar as experiências numa situação de pobreza e perda da guarda dos filhos por decisão judicial, o estabelecimento de vínculo entre a mãe e a criança tem início desde a gestação e passa a ser fortalecido pelas vivencias mais significativas que ocorrem durante a gravidez e logo após o nascimento e as possíveis inadequações de cuidado podem estar associadas a questões sociais e falta de estrutura familiar, demostrando que o processo de tornar-se mãe e exercer a maternidade está fortemente associado ao contexto social em que a mulher está inserida.14

A violência infantil, segundo estudo de revisão integrativa, realizado com o objetivo de caracterizar por meio das evidências científicas a violência infantil no cenário brasileiro, os pais são os maiores perpetradores da violência contra crianças, principalmente quando menores ou igual a 5 anos e a mãe costuma ser a principal agressora.1 Ainda sobre o mesmo estudo, a negligência foi apontada pelos autores como a principal forma de maus-tratos e as violências física e negligência mais comumente verificadas no sexo masculino e da sexual no sexo feminino.1 Dados estes que, ao apontarem a mãe como a principal agressora, fortalecem a necessidade de realização do presente estudo para, a partir do mesmo, melhor compreender a relação que se estabelece entre a violência a maternidade.

CONCLUSÕES

A partir da realização do presente estudo, conclui-se que a maioria das entrevistadas já vivenciaram algum tipo de violência ao longo da vida e um percentual considerável delas, durante o período gestacional. Dentro dos subtipos de violência sofridas destaca-se a violência moral, seguida da psicológica, física, patrimonial e sexual. Quando analisado quem praticou foi achado um resultado semelhante para quase todos os tipos de violência, em que o principal agressor foi o companheiro, seja ele o atual ou de uma relação anterior. Cabendo destacar ainda a conclusão de que prevalência de violência na gestação se eleva, significativamente, nos casos em que as mulheres que não estão em um relacionamento de união estável.

Como uma das limitações deste estudo a não obtenção da amostragem completa prevista em cálculo estatístico em decorrência da diminuição dos números de nascimentos na instituição em decorrência da pandemia Covid-19. Entretanto, cabe ressaltar, que o estudo conseguiu atingir um número considerável de mulheres e que os dados coletados demonstram ser bastante relevantes e representativos sobre o cenário da violência contra as mulheres.

Com base nos resultados, detectamos que a violência contra a mulher possui extrema complexidade na sua constituição e manutenção. É importante o seu estudo a fim de possibilitar que sejam dados a cada envolvido na violência o seu devido tratamento. Não é incomum a sociedade tratar a vítima como culpada, muito utilizada em um passado recente para justificar o ato cometimento do crime pelo autor, que fora motivado por algum comportamento da vítima. Neste contexto entra o papel do enfermeiro qualificado, sabendo estratificar os processos buscando através da empatia, identificar os processos e atuar precocemente no problema, dando suporte para esta mulher que passa por um período de vulnerabilidade. Políticas públicas mais atuantes, como programas de educação e conscientização também se faz necessário.

Por fim, espera-se que a elevada prevalência de casos de violência, encontrada no presente estudo, e a sua possível repercussão no processo de maternidade, sirva como alerta para a necessidade iminente de elaboração de estratégias direcionadas ao aprimoramento da assistência que tem sido oferecida a essas mulheres e aos seus filhos.

REFERÊNCIAS

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Recebido em: 21/08/2020

Aceito em: 01/06/2021

Publicado em: 27/07/2021



[1] Centro Universitário Cesuca. Cachoeirinha, Rio Grande do Sul (RS). Brasil (BR). E-mail: prialberton@hotmail.com ORCID: 0000-0002-3502-0461

[2] Centro Universitário Cesuca. Cachoeirinha, Rio Grande do Sul (RS). Brasil (BR). E-mail: dayane.cicolella@cesuca.edu.br ORCID: 0000-0001-7912-1216

[3] Centro Universitário Cesuca. Cachoeirinha, Rio Grande do Sul (RS). Brasil (BR). E-mail: marcia_dornelles@yahoo.com.br ORCID: 0000-0002-0591-4827

 

Como citar: Rodrigues PA, Cicolella DA, Mariot MDM. Prevalência de violência contra a mulher e suas repercussões na maternidade. J. nurs. health. 2021;11(1): e2111119459. Disponível em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/view/19459





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