ARTIGO ORIGINAL

Proporção de parto normal no sistema único de saúde e na saúde suplementar

Proportion of normal birth in the unified health system and in supplementary health

Proporción de nacimientos normales en el Sistema Único De Salud Y En Salud Suplementaria

Basso, Joeli Fernanda[1]; Souza, Sabrina da Silva de[2]; Laurindo, Dione Lúcia Prim[3]; Cunha, Ana Cláudia da[4]; Suplici, Samara Eliane Rabelo[5]; Zamprogna, Kathery Maris[6]

RESUMO

Objetivo: avaliar o desempenho do indicador Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar, no Estado de Santa Catarina e suas correlações estatísticas com os demais indicadores de pactuação interfederativa 2017-2021. Método: estudo ecológico em que foram calculadas médias e desvios-padrão e coeficiente de correlação de postos de Spearman. Utilizou-se a técnica de análise espacial, com 295 municípios do Estado de Santa Catarina nos anos de 2017 e 2018. Resultados: a proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar, em Santa Catarina, nos anos estudados, esteve correlacionado com casos novos de sífilis congênita e sem significância estatística com a cobertura populacional de equipes de atenção básica, a taxa de mortalidade infantil e número de óbitos maternos. Conclusão: o estudo avaliou que o indicador cobertura de atenção básica impacta positivamente em melhores resultados na proporção de parto normal.

Descritores: Parto normal; Indicadores sociais; Atenção primária à saúde; Saúde suplementar

ABSTRACT

Objective: to evaluate the performance of the Proportion of normal childbirth indicator in the Unified Health System and in Supplementary Health, in the State of Santa Catarina and its statistical correlations with the other indicators of the 2017-2021 inter-federative agreement. Method: ecological study that averages and standard deviations and Spearman rank correlation were calculated. The spatial analysis technique was used, with 295 municipalities in the State of Santa Catarina in the years 2017 and 2018. Results: the proportion of normal birth, in the Unified Health System and in Supplementary Health, in Santa Catarina, in the years studied, was correlated with new cases of congenital syphilis and without statistical significance with the population coverage of primary care teams, the infant mortality rate and the number of maternal deaths. Conclusion: the study evaluated that the primary care coverage indicator positively impacts in better results in the proportion of normal birth.

Descriptors: Natural childbirth; Social indicators; Primary health care; Supplemental health

RESUMEN

Objetivo: evaluar el desempeño del indicador Proporción de partos normales en el Sistema Único de Salud y en Salud Complementaria, en el Estado de Santa Catarina y sus correlaciones estadísticas con los demás indicadores del convenio inter-federativo 2017-2021. Método: estudio ecológico en que se calcularon los promedios y desviaciones estándar y correlación de rangos de Spearman. Se utilizó la técnica de análisis espacial, con 295 municipios del Estado de Santa Catarina en los años 2017 y 2018. Resultados: la proporción de partos normales, en Santa Catarina, en los años estudiados, fue correlacionado con nuevos casos de sífilis congénita y sin significación estadística con la cobertura poblacional de los equipos de atención primaria, la tasa de mortalidad infantil y el número de defunciones maternas. Conclusión: el estudio evaluado de que el indicador de cobertura de atención primaria impacta positivamente en mejores resultados en la proporción de partos normales.

Descriptores: Parto normal; Indicadores sociales; Atención primaria de salud; Salud complementaria

INTRODUÇÃO


As proporções de escolha da via de parto, analisadas na perspectiva do coletivo, se transformam em um indicador de saúde da população. Assim, sempre se espera que ele se movimente em direção às recomendações internacionais de saúde, construídas a partir das melhores evidências de proteção materna e neonatal.1 Ainda como indicador, é importante destacar que ele impacta e é impactado pelas condições de acesso, integralidade, efetividade do atendimento e custo das ações de saúde.

Nessa perspectiva ampla, cabe destacar os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) que está pautado nas recomendações da OMS e organiza seus serviços para que sejam descentralizados e articulados por nível de complexidade.2 Assim, é preciso olhar constantemente para quão balanceada é a equação do indicador com essa base.

Este problema que não é novo, tampouco desconhecido, com a alta incidência de cesáreas no país tem sido apontada como um problema de saúde pública.3 Esta situação, demonstra que há barreiras à implementação das Diretrizes e enseja que estratégias fundamentadas, bem delineadas e pactuadas sejam adotadas para superá-las. Tendo o desafio da complexidade da atenção ao parto, principalmente com vistas à promoção do parto natural, que, por muitos anos, vem sendo desafiada pela medicalização da assistência obstétrica no mundo, inclusive no Brasil.4 

O Brasil possui um dos maiores e mais complexos sistemas de saúde pública de acesso universal do mundo, o Sistema Único de Saúde (SUS), que garante assistência integral desde a atenção primária até a alta complexidade.  De forma suplementar, temos brasileiros que possuem planos privados de saúde.5

Nas últimas décadas, o Brasil, assim como outros países latino-americanos, vivenciou um crescimento alarmante das taxas de cesariana em 2018.4

Para melhor análise de cenário, esses dados globais precisam ser subdivididos, pois a rede privada responde por até 82% desses números, ficando a rede pública com até 37% (dependendo da região do Brasil)6.

A organização dos serviços de atendimento ao parto e nascimento no Brasil ocorre, em sua maioria, por meio da disponibilização de equipes de plantão nos hospitais, que permanecem disponíveis para o atendimento às gestantes em tempo integral, o que contribui para a realização do parto vaginal no SUS, Já, na rede suplementar, além deste modelo, há a possibilidade de agendamento prévio, na qual  o atendimento ao parto é caracterizado pela atenção ao pré-natal e parto sob a responsabilidade de um mesmo médico em locais distintos. Dessa forma, quando ocorre o trabalho de parto, o médico precisa estar disponível para acompanhar a gestante ao hospital e aguardar o nascimento, atendendo de forma exclusiva a gestante. Essa forma de organização do parto na Saúde Suplementar parece ser um obstáculo para o parto vaginal.7

Mas quando se fala em superar o modelo intervencionista, não significa uma completa naturalização do processo, mas sim, que as intervenções utilizem-se das categorias relacionadas à eficácia e ao risco; e que sejam estimuladas a utilização das comprovadamente úteis em favor das prejudiciais e/ou ineficazes.4 Nessa perspectiva, essas estão relacionadas às boas práticas de atenção ao parto e ao nascimento com vistas ao alcance das metas do milênio, com prioridade para a melhoria da saúde, por meio da redução da mortalidade materna e infantil.8

E o alcance delas depende do conhecimento e gestão das informações levantadas pelos indicadores de saúde, que proporcionam a fundamentação indispensável ao planejamento e a avaliação de toda e qualquer ação realizada, bem como as mudanças ocorridas no cenário da situação em saúde.9 Assim, a proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar é um indicador do Sistema de Pactuação Interfederativa de Indicadores (SISPACTO),10 monitorado e pactuado, de maneira tripartite, para a construção de serviços efetivos e resolutivos.11 Ele, assim como os demais 20 indicadores, está vinculado à variável independente de cobertura de saúde da atenção básica da supracitada pactuação, nos anos de 2017 e 2018.

A pactuação que tem a finalidade de reforçar as responsabilidades de cada gestor com as necessidades de saúde da população no território. As informações determinadas pelos indicadores proporcionam a fundamentação indispensável à avaliação das ações realizadas pelo sistema de saúde.11

Como hipótese, este estudo traz que o indicador cobertura de atenção básica impacta positivamente em melhores resultados no indicador Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar, de pactuação interfederativa 2017-2021. E como objetivo: avaliar o desempenho do indicador Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar, no Estado de Santa Catarina e suas correlações estatísticas com os demais indicadores de pactuação interfederativa 2017-2021.

MÉTODO

Estudo ecológico o qual utilizou a técnica de análise espacial, realizado com base em dados secundários da Pactuação Interfederativa 2017 – 2021. O período estudado foram os anos de 2017 e 2018, tomando-se como unidades de análise os 295 municípios do Estado de Santa Catarina utilizando o método de registros de relacionamento probabilístico. Para este estudo, os indicadores da pactuação 2017-2021, dados secundários, de acesso público, foram extraídos do banco de dados oficiais do Estado de Santa Catarina.12 A variável dependente foi o percentual de parto normal no SUS e na saúde suplementar. Essa variável considera o número de nascidos vivos por parto normal ocorridos, de mães residentes em determinado local no ano considerado, dividido pelo número de nascidos vivos de todos os partos, de mães residentes no mesmo local, no ano considerado, vezes o fator de multiplicação 100. A unidade de medida é expressa em percentual13 (destaca-se que dos 21 indicadores da pactuação interfederativa, nove são de proporção, incluindo este). As variáveis independentes foram os demais indicadores de pactuação interfederativa 2017-2021.

O processo de análise de dados da presente pesquisa iniciou-se com uma exploração descritiva incluindo média, desvio padrão, mediana, percentil 25 e 75, mínimos e máximos para todos os indicadores de estudo. Para testar a hipótese de que os indicadores selecionados não eram correlacionados entre si foi proposta uma matriz de correlação a partir do cálculo do coeficiente de correlação de postos de Spearman. Foram plotados ainda mapas coropléticos com indicadores selecionados para avaliação a distribuição dos indicadores na área de estudo para o ano de 2017 e 2018. Todos os testes levaram em consideração um α bidirecional de 0,05 e um intervalo de confiança (IC) de 95% e foram realizados com apoio computacional dos softwares: R (o qual pode ser acessado em: https://www.r-project.org/), do StatisticalPackage for the Social Sciences  (IBM SPSS 25) e do Microsoft Office Excel 2016®.

Este estudo é parte de um macroprojeto que avaliou a cobertura populacional pelas equipes de Atenção Básica nos municípios de Santa Catarina e o alcance dos indicadores da pactuação interfederativa 2017-2021, cada um desses 23 indicadores foram identificados pela letra V (variável) seguida de uma numeração arábica (1 a 23).

Na matriz de correlação de Spearman, apresentada neste trabalho, a variável percentual de parto normal no SUS e na saúde suplementar será apresentada como V16 e a variável Cobertura populacional pelas equipes de Atenção Básica e de Saúde da Família como V23 e V21 respectivamente. Serão ainda correlacionados os demais indicadores da pactuação interfederativa como a Razão de exame de colo de útero (V14), Razão de exames de mamografia (V15), Número de óbitos por doença crônica não transmissível (V4), Taxa de mortalidade prematura por doença crônica não transmissível (V5), Casos novos de Sífilis Congênita (V11), Número de óbitos infantis (V18), Proporção de óbitos em mulheres em idade fértil investigados (V6), Proporção de óbitos por causa básica definida (V7), Proporção de vacina com cobertura adequada (V8), Proporção de casos de doenças de notificação encerrados (V9), Proporção de cura de Hanseníase (V10), Casos de Aids em menores de 5 anos (V12), Proporção de análise de água realizada (V13), Taxa de mortalidade infantil (V19) e Número de óbitos maternos (V20).

Os aspectos éticos da pesquisa com seres humanos ocorreram no curso da investigação, de acordo com a resolução 466/12 e complementares. A Resolução nº 510, de 04/07/2016, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), em seu parágrafo único, incisos II, III e IV, determina que “não precisará ser registrada e avaliada pelo Comitê de Ética e Pesquisa as pesquisas que usam informações no domínio público”. A investigação ocorreu a partir de fontes de dados secundários, não implicando em qualquer risco para os sujeitos, seguindo as diretrizes e padrões regulatórios em pesquisa. 

RESULTADOS

O indicador Porcentagem de parto normal teve, em 2018, médias discretamente melhores que em 2017, diferente da cobertura populacional de Saúde da Família e de Equipes de Atenção Básica, que pioraram, também discretamente, suas médias em 2018, comparativamente com 2017 (Tabela 1).

Tabela 1: Tabela descritiva dos diferentes indicadores para o ano de 2017 e 2018.

Variáveis

2017

Média

DP

Mediana

P25

P75

Mínimo

Máximo

% de parto normal

38,2%

13,3%

38,2%

30,1%

47,2%

3,6%

100,0%

Cobertura populacional de Saúde da Família

95,8

12,4

100,0

100,0

100,0

0

100,0

Cobertura populacional de equipes de Atenção Básica

82,8

25,3

100,0

65,4

100,0

0

100,0

  

2018

Média

DP

Mediana

P25

P75

Mínimo

Máximo

% de parto normal

38,6%

13,1%

39,8%

30,5%

47,7%

0,0%

80,8%

Cobertura populacional de Saúde da Família

95,7

12,8

100,0

100,0

100,0

0

100,0

Cobertura populacional de equipes de Atenção Básica

82,4

25,5

100,0

66,7

100,0

0

100,0

DP – Desvio Padrão, P25 – Percentil 25, P75 – Percentil 75

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Nas Figuras 1 e 2 podemos observar a correlação dos demais indicadores da pactuação interfederativa, na qual quanto mais forte for à cor, mais bem correlacionados estão os indicadores. Assim, ela nos traz uma visão geral de quais indicadores a Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar apresentou correlação inversa, com quais apresentou correlação e com quais não apresentou relevância estatística ou correlação.

2017

Teste de correlação de Spearman (na Figura 1 quanto mais forte a cor mais bem correlacionado é o indicador).

Figura 1: Correlação dos indicadores 2017

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

2018

Teste de correlação de Spearman (na Figura 2 quanto mais forte a cor mais bem correlacionado é o indicador).

Figura 2: Correlação dos indicadores 2018.

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

 

Em 2017, o indicador percentual de parto normal (V16) mostrou-se inversamente correlacionado aos indicadores Razão de exame de colo de útero (V14) e Razão de exames de mamografia (V15), diretamente correlacionado com os indicadores Número de óbitos por doença crônica não transmissível (V4), Taxa de mortalidade prematura por doença crônica não transmissível (V5), Casos novos de Sífilis Congênita (V11) e Número de óbitos infantis (V18). Ainda se mostrou sem relevância estatística na correlação com os indicadores Cobertura populacional pelas equipes de Atenção Básica. (V23), Cobertura populacional de Saúde da Família (V21), Proporção de óbitos em mulheres em idade fértil investigados (V6), Proporção de óbitos por causa básica definida (V7), Proporção de vacina com cobertura adequada (V8), Proporção de casos de doenças de notificação encerrados (V9), Proporção de cura de Hanseníase (V10), Casos de Aids em menores de 5 anos (V12), Proporção de análise de água realizada (V13), Taxa de mortalidade infantil (V19) e Número de óbitos maternos (V20).

Em 2018, o indicador Proporção de parto normal (V16) esteve inversamente correlacionado ao indicador Proporção de análise de água realizada (V13) e manteve esse padrão em relação ao indicador Razão de exames de mamografia (V15). Seguiu diretamente correlacionado aos indicadores Número de óbitos por doença crônica não transmissível (V4), Taxa de mortalidade prematura por doença crônica não transmissível (V5) e Casos novos de Sífilis Congênita (V11). Sua irrelevância estatística ficou para a correlação com os indicadores Cobertura populacional de equipes de Atenção Básica (V23), Cobertura populacional de Saúde da Família (V21), Proporção de óbitos em mulheres em idade fértil investigados (V6), Proporção de óbitos por causa básica definida (V7), Proporção de vacina com cobertura adequada (V8), Proporção de casos de doenças de notificação encerrados (V9), Proporção de cura de Hanseníase (V10), Casos Aids em menores de 5 anos (V12), Razão de exame de colo de útero (V14), Taxa de mortalidade infantil (V19) e Número de óbitos maternos (V20).

DISCUSSÃO

Inúmeros são os esforços para que a Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar brasileira chegue a 85%-90% dos partos. O que reforça a necessidade de articulação de estratégias para redução do parto cesáreo entre os gestores do SUS e gestores dos planos privados de saúde, mediada pela regulação da Agência Nacional de Saúde Suplementar.10 Desde 1985, a comunidade médica internacional considera que a taxa ideal de cesárea fique entre 10% e 15%.15 No entanto, o Brasil vive uma ordem invertida, caracterizando uma epidemia de nascimentos cirúrgicos e detendo a segunda maior taxa de cesáreas do planeta, com 55%, perdendo apenas para a República Dominicana, onde a taxa é de 56%. Para se ter melhor compreensão da discrepância com países desenvolvidos, na Europa a taxa é de 25%, e nos EUA, 32,8%.14

Em Santa Catarina, os dados obtidos através da observação do indicador como integrante dos 21 indicadores da pactuação interfederativa mostram, para os anos de 2017 e 2018, médias de 38,2% e 38,6% de partos normais, respectivamente. Ficando então com uma média para partos cirúrgicos ou cesarianas estimada em 61,8% e 61,4%. E dentre os motivos que revelam maiores taxas de cesarianas no estado de Santa Catarina está, sobretudo, o aspecto socioeconômico, em que mulheres com alto nível de escolaridade, de etnia/cor da pele branca e que vivem em regiões com melhor acesso ao serviço de saúde elevam a taxa de cesariana no estado.  Assim, Santa Catarina se mantém com média superior a nacional, mostrando uma urgente necessidade de se olhar para o cenário e compreendê-lo.15 A superação das barreiras identificadas para implementação pode favorecer as boas práticas assistenciais e reduzir as altas taxas cesarianas desnecessárias e de mortes maternas e neonatais evitáveis.4 A eficácia de intervenções no campo da obstetrícia depende da natureza das estratégias usadas e os seus resultados são diferentes de acordo com a unidade de alocação e os prestadores de serviço.16

A correlação do indicador com os casos de sífilis congênita também chama especial atenção. Não pela via de parto em si, que deve continuar sendo incentivada rumo as metas de segurança para a saúde materna e infantil preconizadas pela OMS, mas pelo não rastreamento efetivo da sífilis e tratamento dos casos durante o pré-natal. Já em 2013, o Ministério da Saúde intensificou ações e estratégias no campo da promoção, prevenção, ampliação do diagnóstico, tratamento monitoramento e vigilância da sífilis. Dentre as principais: testagem rápida no pré-natal, incentivo a administração de penicilina benzatina durante o pré-natal, criação de caderno de boas práticas para o bloqueio da transmissão vertical, criação de protocolos de investigação de transmissão vertical para orientar a criação de comitês municipais e estaduais que possam investigar as possíveis falhas, monitoramento da situação epidemiológica e capacitação de profissionais de saúde.17

Existem ainda orientações globais para eliminação da transmissão vertical de sífilis, triagem e tratamento adequado. Entre 2015 e 2016, Cuba, Bielorrússia, República da Moldávia e Tailândia as cumpriram e conseguiram zerar a transmissão materno-infantil da sífilis, mostrando ser um feito absolutamente possível.18

Porém, para melhores números relacionados tanto à proporção de parto normal, quanto a sua não correlação com casos de sífilis congênita, acredita-se que seja importante refletirmos sobre o curioso fato da não relevância estatística na correlação com os indicadores Cobertura populacional de equipes de Atenção Básica. Se é na atenção primária que acontecem todas as estratégias de educação em saúde e acompanhamento pré-natal, é preciso entender melhor como têm acontecido, na prática, essas ações.

Talvez compreendendo essas lacunas, seja possível também entender sua irrelevância igualmente curiosa com a taxa de mortalidade infantil e número de óbitos maternos, pois evidências mostram que a cesariana, quando não tem indicação médica, ocasiona riscos desnecessários à saúde da mulher e do bebê: aumentando em 120 vezes a probabilidade de problemas respiratórios para o recém-nascido e triplicando o risco de morte da mãe. As mortes contabilizadas como materna englobam óbitos causados por problemas relacionados à gravidez, ao parto, ou ocorridos até 42 dias depois e são um velho problema no Brasil.19

Cabe ressaltar ainda que o expressivo número de procedimentos cirúrgicos, suas internações e potenciais tratamentos de complicações representam o desperdício de milhões de reais por ano no SUS, que poderiam ser investidos para melhorias da assistência.20 Ter essa compreensão é importante para caminharmos assertivamente rumo à meta nacional de reduzir a mortalidade materna para 30/100 mil nascido vivos até 2030, como parte dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável 2015/2030, assumida internacionalmente.

Um breve histórico mostra que entre 1990 e 2015, o Brasil teve uma diminuição de 56%. Quando observados os anos de 2015 e 2016, é possível constatar queda de mais 16% nos números (de 1.738 casos de morte materna para 1.463 casos). Entre 2017 e 2018, a redução foi mais modesta: 8,4%. Em 2018, a Razão de Mortalidade Materna no país foi de 59,1 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos, enquanto no ano anterior era de 64,5, evidenciando que há um longo caminho a ser percorrido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados extraídos dos bancos oficiais do Estado de Santa Catarina disponíveis e de acesso público da DIVE/SC refutaram a hipótese de que o indicador cobertura de atenção básica impacta positivamente em melhores resultados no indicador Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar, de pactuação interfederativa 2017-2021.

O desempenho do indicador Proporção de parto normal no Sistema Único de Saúde e na Saúde Suplementar, com suas ainda tímidas médias de 38,2% e 38,6%, em 2017 e 2018, respectivamente, e suas correlações estatísticas com os demais indicadores de pactuação interfederativa 2017-2021, que o afastam de metas importantes como erradicação da sífilis congênita e a diminuição das mortalidades materna e infantil, mostram a urgente necessidade de repensar como a atenção básica têm baseado suas ações nas demandas e necessidades de atenção à saúde advindas do perfil demográfico e epidemiológico da população. Pois é essa coerência que fará com que se consiga avançar, na prática, em relação ao acesso, à integralidade, à efetividade e ao custo apropriado das ações de saúde e, assim, operacionalizem-se, de fato, princípios filosóficos e operacionais do Sistema Único de Saúde (SUS) que implicam a organização de serviços de saúde descentralizados e articulados por nível de complexidade.

Por fim, reconhecem-se os grandes desafios que, em diferentes contextos, o SUS vive desde sua concepção, mas ressalta-se que a avaliação constante dos seus indicadores é elemento fundamental para a criação de iniciativas multissetoriais voltadas à efetivação das suas práticas, propostas pelo movimento internacional de acesso universal a saúde.

Dentre as limitações deste estudo, apontamos que, apesar dos esforços no sentido da redução dos sub-registros, podem ocorrer eventos não identificados na utilização de dados secundários. Essa limitação não reduz a confiabilidade do estudo, mas deve ser considerada na interpretação dos resultados.

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Recebido em: 20/07/2020

Aceito em: 18/02/2021

Publicado em: 22/02/2021



[1] Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Florianópolis, Santa Catarina (SC), Brasil (BR). E-mail: joelifb@gmail.com ORCID: 0000-0001-6365-2733

[2] Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Florianópolis, Santa Catarina (SC), Brasil (BR). E-mail: enfermeirasabrina@gmail.com ORCID: 0000-0001-9046-6434

[3] Prefeitura Municipal de São José (PMSJ). São José, Santa Catarina (SC), Brasil (BR). E-mail: dione.prim@gmail.com ORCID: 0000-0001-6233-2527

[4] Prefeitura Municipal de São José (PMSJ). São José, Santa Catarina (SC), Brasil (BR). E-mail: cau_cunha@yahoo.com.br ORCID: 0000-0003-2292-3917

[5] Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Florianópolis, Santa Catarina (SC), Brasil (BR). E-mail: samara.suplici@gmail.com ORCID: 0000-0002-0334-7195

[6] Prefeitura Municipal de São José (PMSJ). São José, Santa Catarina (SC), Brasil (BR). E-mail: katherizamprogna@gmail.com ORCID: 0000-0002-5987-1025

 

Como citar: Basso JF, Souza SS, Laurindo DLP, Cunha AC, Suplici SER, Zamprogna KM. Proporção de parto normal no sistema único de saúde e na saúde suplementar. J. nurs. health. 2021;11(1):e2111119256. Disponível em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/view/19256





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