Almeida CB, Casotti CA. Estilo de vida da população afrodescendente: revisão integrativa. J. nurs. health. 2020;10(n.esp.):e20104012

https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/download/15745/11488

REVISÃO INTEGRATIVA

Estilo de vida da população afrodescendente: revisão integrativa

Afro-descendant population lifestyle: integrative review

Estilo de vida de la población afrodescendiente: revisión integrativa

Almeida, Claudio Bispo de[1]; Casotti, Cezar Augusto[2]

RESUMO

Objetivo: identificar, por meio de uma revisão integrativa, como os artigos científicos publicados no período de 2014 a 2016 se relacionam ao estilo de vida da população afrodescendente. Método: revisão integrativa em artigos publicados no período de 2014 a 2016, com a combinação African continental ancestry group AND Life style, em seis bases de dados. Resultados: localizou-se 318 artigos, e 20 artigos foram selecionados, que tratam de estudos realizados nos Estados Unidos; pesquisa transversal; atividade física como variável do estilo de vida mais estudada; e trabalhou com duas ou mais divisões de etnias. Conclusões: nenhum estudo pesquisou as dimensões atividade física, nutrição, controle do estresse, comportamentos preventivos e relacionamentos simultâneamente. Assim, ampliar as pesquisas com mais dimensões do estilo de vida pode fornecer mais informações aos profissionais que atuam na assistência à saúde, e contribuir na criação e reformulação de ações e políticas de saúde.

Descritores: Estilo de vida; Grupo com ancestrais do continente africano; saúde

ABSTRACT

Objective: to identify, through an integrative review, how scientific articles published in the period from 2014 to 2016 are related to the lifestyle of the Afro-descendant population. Method: integrative review of articles published from 2014 to 2016, with the combination African continental ancestry group AND Life style, in six databases. Results: 318 articles were found, and 20 articles were selected, which deal with studies carried out in the United States; cross-sectional research; physical activity as the most studied lifestyle variable; and worked with two or more ethnic divisions. Conclusions: no study has researched the dimensions of physical activity, nutrition, stress control, preventive behaviors and relationships simultaneously. Thus, expanding research with more dimensions of lifestyle can provide more information to professionals working in health care, and contribute to the creation and reformulation of health actions and policies.

Descriptors: Life style; African continental ancestry group; Health

RESUMEN

Objetivo: identificar, a través de una revisión integradora, cómo los artículos científicos publicados en el período de 2014 a 2016 están relacionados con estilo de vida de la población afrodescendiente. Método: revisión integradora de artículos publicados de 2014 a 2016, con la combinación African continental ancestry group AND Life style, en seis bases de datos. Resultados: se encontraron 318 artículos y se seleccionaron 20, que se ocupan de estudios realizados en los Estados Unidos; investigación transversal; actividad física como la variable de estilo de vida más estudiada; y trabajó con dos o más divisiones étnicas. Conclusiones: ningún estudio ha investigado actividad física, nutrición, control del estrés, comportamientos preventivos y relaciones simultáneamente. Por lo tanto, expandir la investigación con más dimensiones del estilo de vida puede proporcionar más información a los profesionales que trabajan en la atención de salud y contribuir a la creación y reformulación de acciones y políticas de salud.

Descriptores: Estilo de vida; Grupo de ascendencia continental africana; Salud

INTRODUÇÃO

As características das morbidades sofreram influência da chamada transição epidemiológica, período em que as pessoas passaram a adoecer e morrer menos por doenças infectocontagiosas, e mais por doenças crônico-degenerativas.1 Uma das consequências desta transição foi o aumento da longevidade populacional, e o crescimento das doenças crônico-degenerativas, o que ressaltou a importância dos hábitos diários de cada pessoa para a saúde, e deve-se considerar, neste contexto, que houveram avanços no desenvolvimento sanitário, social, científico.1-3

A partir desta transição, o estilo de vida das pessoas passa a ser algo imprescindível na determinação de seu estado de saúde, levando-se em consideração os hábitos de atividade física, os nutricionais, os níveis de estresse, os relacionamentos e os comportamentos preventivos.1-2 Estes cinco componentes do estilo de vida afetam a saúde de forma geral, e estão associados ao bem-estar psicológico e várias doenças crônicas, como por exemplo, hipertensão, obesidade, dentre outras.1

O Estilo de vida pode ser definido como um conjunto de ações habituais que refletem as atitudes, os valores e as oportunidades na vida das pessoas.1 Ao estudar-se as populações afrodescendentes, deve-se considerar as particularidades de condições em que vivem nas diversas partes do mundo, e seus diferentes processos históricos. Tem-se, por exemplo, o tráfico de escravos oriundos do continente africano para as Américas, fato que ocasionou uma redução das oportunidades ao longo do tempo, interferindo no estilo de vida desta população.

Um exemplo de restrição de possibilidade de melhora do estilo de vida da população negra pode ser visto em comunidades quilombolas no Brasil, nas quais as limitações das oportunidades aos serviços básicos de saúde e a precariedade de condições de vida, socioeconômicas, saneamento básico e de saúde contribuem para tal situação.3-4 Tem-se, ainda, a escassez de estratégias de intervenção, pelo sistema público de saúde, que propiciem à equidade em saúde voltada à população negra, e que reflitam nas ações de gestores e profissionais de saúde.5

O estilo de vida possui alguns fatores negativos que são modificáveis como, por exemplo: fumo, álcool, drogas, alimentação inadequada, estresse, isolamento social, sedentarismo, esforços intensos ou repetitivos. Apesar de estes fatores sugerirem a possibilidade de um poder de decisão pelas pessoas, para a determinação de tais comportamentos, é preciso considerar os fatores não modificáveis, como por exemplo, o ambiente físico e as características sociais do local onde vivem.1

Em uma comunidade quilombola baiana, identificou-se que existe cerca de 80% de indisponibilidade de locais para comprar frutas e verduras na vizinhança, sendo que a maioria dos indivíduos consumia legumes/verduras e frutas pelo menos uma vez no dia. As prevalências de hábito de fumar (19,6%) e de consumo de álcool (13,1%) encontradas na comunidade, podem ser consideradas como fatores de risco à saúde.6 Nota-se que, a falta de locais para comprar frutas e verduras na comunidade, dificulta a adoção de hábitos alimentares saudáveis.

Ao avaliar africanos e afrodescendentes que vivem na Jamaica, observou-se que o nível de glicose plasmática está associado ao índice de massa corporal, idade, sexo, tabagismo, hipertensão arterial e atividades diárias sedentárias. De modo geral, a obesidade, os riscos metabólicos e outros determinantes variam de acordo o estágio em que as populações estudadas se encontram na transição epidemiológica.7

Os Estados Unidos são um exemplo de país no qual o estilo de vida é constituído por meio de hábitos alimentares inadequados (ricos em sais, açúcares e frituras), baixos níveis de atividade física, descontrole do estresse nos grandes centros, dentre outros fatores. Esses comportamentos tornam-se um determinante para as condições de saúde da população, e podem levar ao surgimento de obesidade e doenças crônicas. Em estudo com estrangeiros que viviam nos Estados Unidos, percebeu-se que a prevalência de obesidade e diabetes melitos aumentou em relação ao tempo que vivem nos Estados Unidos.8

Ao analisar a pressão sanguínea em afrodescendentes americanos e de sul-africanos, percebeu-se que as medias da pressão arterial foram muito similares em homens e mulheres. Neste mesmo estudo, a pressão sanguínea foi significativamente mais alta nos descendentes de sul africanos, após os ajustes nas análises estatísticas.9

Para uma melhor compreensão do estilo de vida de populações vulneráveis, como a de afrodescendentes, propõem-se estudá-lo considerando os seguintes componentes, a partir do pentáculo do bem-estar: atividade física, nutrição, controle do estresse, comportamentos preventivos e relacionamentos.10 Assim, ao conhecer estas dimensões, torna-se possível identificar fatores que poderão influenciar a saúde de forma positiva ou negativa, e consequentemente, orientar e planejar ações que ajudem na manutenção de um estilo de vida positivo, evitando-se, assim, adoecimentos e mortes.

Conhecer o estilo de vida das populações afrodescendentes pode contribuir para o entendimento de saúde da população avaliada, e direcionar ações nos serviços básicos de saúde. Desta forma, o presente estudo é norteado pela seguinte pergunta de investigação: como as publicações retratam a relação do estilo de vida com a população afrodescendente? E apresenta o seguinte objetivo identificar, por meio de uma revisão integrativa, como os artigos científicos publicados no período de 2014 a 2016 se relacionam ao estilo de vida da população afrodescendente.

MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de uma revisão integrativa, que visa evidenciar o exposto nas produções científicas, considerando o período de 2014 a 2016, sobre o estilo de vida da população afrodescendente, seguindo o rigor metodológico proposto por Ganong para este tipo de estudo.11 E para verificação da qualidade das evidências utilizou-se a classificação de Melnyk.12

Na investigação metodológica, esta revisão integrativa foi dividida em seis etapas, são elas: 1) seleção da pergunta de investigação; 2) definição dos critérios de inclusão dos estudos e seleção da amostra; 3) representação dos estudos selecionados em tabelas, considerando todas as características em comum; 4) análise crítica das descobertas, identificando diferenças e conflitos; 5) interpretação dos resultados, e; 6) informar de forma clara a evidência encontrada, a qual constitui a apresentação da revisão.11

Para classificação dos níveis de evidências, considerou-se os sete níveis de Melnyk, são eles: nível 1, evidências provenientes de revisões sistemáticas ou metanálise oriundas de ensaios clínicos; nível 2, evidências derivadas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado; nível 3, evidências provenientes de ensaios clínicos sem randomização; nível 4, evidências oriundas de estudos de coorte e de caso-controle bem delineados; nível 5, evidências derivadas de revisões sistemáticas de estudos descritivos e qualitativos; nível 6, evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo; e nível 7, evidências provenientes de opnião de autoridades ou relatório de comitês de especialistas.12

Na busca realizada nas bases de dados, utilizou-se os seguintes Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), e indicadores booleanos combinados da seguinte forma: African Continental Ancestry Group and Life style.

Os critérios de inclusão foram: artigos originais que abordassem o estilo de vida da população afrodescedente, em pelo menos um dos aspectos do estilo de vida (atividade física, nutrição, estresse, comportamentos preventivos ou relacionamentos); estudos realizados fora do continente africano; estudos com resumos e textos completos disponíveis; em qualquer idioma; publicações do período de 2014 a 2016, indexados nas bases de dados Medical Literature Analysis and Retrieval System (MEDLINE), Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), SCOPUS, Web of Science, e nas bibliotecas eletrônicas PubMed e SciELO; que fizessem referência em seus títulos ou resumos ao estilo de vida, e que nestes itens ou nos métodos identificassem a população de estudo. 

Os critérios de exclusão foram: estudos duplicados, carta ao editor, dissertações, teses, estudos de reflexão, recomendações, assim como outros trabalhos que apresentaram temáticas diferentes da proposta desta pesquisa.

As buscas nas bases de dados ocorreram no período de 16 de novembro de 2017 a 23 de novembro de 2017, conforme Figura 1.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No período estudado, foram identificados 318 artigos publicados. Após serem atendidos os critérios de inclusão e exclusão, permaneceram 20 artigos no presente estudo (Figura 1). As publicações tiveram um equilíbrio no quantitativo de estudos selecionados nos anos de 2014 e 2015, apresentando oito publicações, em cada ano (Tabela 1). Entretanto, no ano de 2016 encontrou-se quatro estudos que abordaram pelo menos uma das dimensões do estilo de vida propostas pelo modelo do pentáculo do bem-estar.10

Tabela 1: Características dos estudos investigados sobre estilo de vida e afrodescendentes (n=20)

Autor/ Ano

Tipo de Estudo/ Nível de Evidência

Principais Resultados*

*Estilo de Vida

País

Aragão, Bós, Souza24/2014

transversal/VI

Alta prevalência de síndrome metabólica (...).

AF; CP.

Brasil

Silva et al.25/2016

transversal/VI

Boa prática de AF, mas fumam e bebem.

CP; AF.

Brasil

Tantamango-Bartley et al.13/2016

coorte prospectiva/IV

As dietas veganas podem conferir menor risco de câncer de próstata.

Nut.

Estados Unidos e Canadá

Bärebring et al.28/2016

coorte/IV

Relação do desfecho e fatores de estilo de vida.

Nut.

Suécia

Derose et al.14/2015

transversal/VI

Os negros menos ativos fisicamente.

AF.

Estados unidos

Sonnenberg et al.29/2015

transversal/VI

A maioria não relatou sintomas de infecção.

CP.

 

Inglaterra

Toselli et al.27/2014

transversal/ VI

 

O excesso de peso e a obesidade eram elevados.

AF; Nut.

Itália

Upchurch et al.15/2015

transversal/VI

A associação entre AF e desfecho.

AF.

Estados Unidos

Koerching, Proietti,César4/2014

transversal/VI

Associação com consumo de frutas, verduras(...)

AF; Nut.; CP

Brasil

Paynter et al.31/2014

coorte/IV

AF recreativa associada ao risco cardiovascular.

AF; Nut.; CP.

Canadá

Santos et al.26/2014

transversal/VI

Desfecho associado a ser fumante (...)

AF; CP.

Brasil

Cesari et al.16/2015

transversal/VI

Relação AF redução da fragilidade(...)

AF.

Estados Unidos

Yaghjyan et al.17/2014

transversal/VI

O câncer de mama não se associou com a raça.

Nut.; AF; CP

Estados Unidos

McKibben et al.18/2016

longitudinal/IV

Estilo de vida associado a alterações no desfecho.

AF; CP.

Estados Unidos

Boucher et al.19/2015

coorte prospectiva/IV

Relação de hábitos Nut. e AF com a adiposidade (...)

AF; Nut.

Estados Unidos

Agyei et al.30/2014

transversal/VI

Sem relação do Est. e a hipertensão (...)

Est.; CP.

Holanda

Matthews et al.20/2014

coorte prospectiva/IV

Menor nível de AF, maior risco de morte (...)

AF.

Estados Unidos

Fraser et al.21/2015

coorte/IV

Há vantagens no uso de dieta vegetariana (...)

Nut.

Estados Unidos

Kulshreshtha et al.22/2015

coorte/IV

O desfecho foi associado ao tabagismo (...)

CP.

Estados Unidos

Villegas et al.23/2015

coorte/IV

Consumo de peixe e menor risco de mortalidade total.

Nut.; CP; AF.

Estados Unidos

*os componentes do estilo de vida foram abreviados: AF=atividade física; CP=comportamento preventivo; Nut.=nutrição; Est.=estresse.

Fonte: dados de pesquisa, 2017.

Os Estados Unidos (Tabela 1) mostraram um maior número de estudos realizados sobre o estilo de vida da população afrodescendente, totalizando 11 estudos,13-23 seguido do Brasil com quatro estudos.4,24-26 O fato dos Estados Unidos apresentarem, em geral, um estilo de vida negativo, pode explicar a preocupação deste país estudar o estilo de vida, tendo em vista as consequências desses hábitos para a saúde de sua população.

Na presente pesquisa, verificou-se que, em um mesmo estudo,13 a pesquisa foi realizada com populações de dois ou mais países. Outros estudos foram realizados na Itália27 e na Suécia,28 porém analisaram populações diferentes das nativas. Nestes casos, foram estudados, respectivamente, crianças italianas e imigrantes, e mulheres que viviam na Suécia, mas nascidas em outras localidades.

Em relação ao tipo de estudo (Tabela 1) observou-se que o transversal foi o mais recorrente, com 11 artigos (55%),4,14-17,24-27,29-30 seguido do estudo de coorte que teve oito artigos (40%),13,19-23,28,31 e somente um artigo tinha como tipo de estudo o longitudinal (5%).18 Em relação ao nível de evidência (Tabela 1), foram contemplados os níveis IV e VI, sendo mais prevalente estudos com nível VI totalizando onze artigos (55%).4,14-17,24-27,29-30 Com estes achados propõe-se que existe a necessidade de produção de artigos com maiores níveis de evidência.

Um dos estudos atentou aos fatores negativos e positivos do estilo de vida, ao analisar homens e mulheres quilombolas no Brasil.4 Os comportamentos negativos foram: inatividade física (74,2%), fumar (19,8%). E os positivos foram: consumo diário satisfatório de frutas e verduras (69,3%) e o não consumo de bebida alcoólica (58,6%). Os hábitos saudáveis conduzem ao estilo de vida positivo que, consequentemente, podem ocasionar uma saúde positiva, enquanto que comportamentos não saudáveis podem promover situações de morbidades, e em caso mais extremos à morte.1

A Organização Mundial de Saúde indica que as intervenções comunitárias, ao orientarem as modificações no estilo de vida aconselhando a prática de atividades físicas moderadas e dietas orientadas, tem sido um fator protetor para diabetes mellitus em pessoas que apresentavam intolerância a glicose, efeito similar ao uso de medicamentos.2 Entretanto, deve-se considerar o estilo de vida além destas dimensões, como por exemplo, acrescentar a prática de comportamentos preventivos, cultivo de relacionamentos sociais, o controle do estresse, e as condições e oportunidades que as pessoas possuem.1

No presente estudo, nota-se que a dimensão mais referida foi a atividade física (Tabela 1 e Tabela 2). Sabe-se que indivíduos que possuem baixos níveis de prática de atividades físicas apresentam menores benefícios relacionados à saúde do que aqueles com altos níveis de atividade física.2 Assim, torna-se evidente a importância da busca por um estilo de vida ativo, para a promoção da saúde e redução da mortalidade por todas as causas.1

Neste sentido, percebe-se que a atividade física está associada de forma significativa com: síndrome metabólica;24 menor nível de atividade física entre negros;14-15,20 melhora da fragilidade óssea em idosos;16 baixo risco para doenças cardiovasculares;31 controle de peso corporal,27 e aspectos nutricionais.19

Assim, observou-se que, em relação a esta dimensão, alguns estudos mostraram benefícios da atividade física sobre: a carga alostática em mulheres de meia-idade,15 melhoria da fragilidade óssea em idosos,16 aumento dos níveis de vitamina D18 e redução do risco de mortalidade por todas as causas.20 Entretanto, percebeu-se que, no estudo realizado em um parque público na cidade de Los Angeles, Estados Unidos, os negros se exercitavam menos do que os brancos,14 o que evidenciou a desigualdade no uso deste espaço.

Um dos estudos atentou para a importância da necessidade de esforços para a promoção da saúde, ao incentivar o aumento dos níveis de atividade física e redução do tempo de comportamento sedentário, pois ambos podem ajudar a reduzir o risco de mortalidade em adultos negros.20 Apesar de não ter sido contemplado na proposta deste estudo, o comportamento sedentário faz parte do estilo de vida, ressalta-se que se trata de um constructo diferente da atividade física e que pode acarretar danos à saúde quando em excesso.

Na presente pesquisa, nota-se que a nutrição foi outra dimensão muito encontrada nos artigos avaliados.4,13,17,19,21,23,27,28,31 Em um estudo, encontrou-se que a melhor autoavaliação de saúde aconteceu entre os indivíduos que relataram consumo satisfatório de frutas e verduras.4 Hábitos alimentares veganos foram relatados nos artigos avaliados, e mostraram-se associados à menor risco de câncer de próstata,13 e a redução de risco cardiovascular em populações negras.23 Outro artigo evidenciou um pequeno benefício favorável ao consumo de peixe sobre mortalidade.23

Entre os artigos que avaliaram a dimensão comportamentos preventivos (Tabela 1), foram observados os seguintes comportamentos: etilismo; tabagismo; colesterol elevado; e ao controle da pressão arterial. Um estudo citou o comportamento preventivo referindo-se à saúde sexual.29 Outro estudo abordou a importância de se detalhar as medidas de estilo de vida em modelos de análises tradicionais ao se estudar doenças cardioasculares.31

Neste estudo, em sete artigos (35%) a variável etnia foi categorizada em: brancos, negros e outras etnias15-17,22,29-31; em seis (30%) foi dicotomizada em brancos e negros,13-14,18-20,23 e um (5%) conduzido com crianças residentes na Italia categorizou a variável etnia em imigrantes e italianas.27 A etnia foi destacada por ser uma variável importante a ser considerada nos estudos, a qual pode ser utilizada para direcionar futuras ações de acordo com a específicidade de cada uma delas.

Observou-se que quatro estudos (20%) investigaram populações quilombolas, e todos realizados no Brasil.4,24-26 E outros dois estudos (10%) abordaram, específicamente, a população afrodescendente, um deles pesquisou os afroamericanos,21 e o outro investigou as mulheres negras.28 É compreensível que a realização de estudos com quilombolas sejam brasileiros, tendo em vista que a nomenclatura utilizada para caracterizar esta população possui uma história própria e específica desta nacionalidade. Em relação aos estudos comparativos entre negros e outras etnias, investigar as especificidades pode responder a diversas questões de saúde, e contribuir na proposição de ações de intervenção direcionadas a este público.

Na proposta do pentáculo do bem-estar, o perfil do estilo de vida deve ser analisado com base em cinco dimensões: atividade física, nutrição, controle do estresse, comportamentos preventivos e relacionamentos.10 Os artigos pesquisados  não apresentaram tais dimensões em sua totalidade, tendo alguns analisado, no máximo, três componentes simultaneamente.4,17,23,31

Na Tabela 2, observou-se a presença das dimensões atividade física (70%), comportamentos preventivos (55%) e nutrição (45%). O controle do estresse foi observado apenas em um estudo (5%), enquanto a dimensão relacionamentos, não foi avaliada nos artigos, deve-se ter em vista que esta é considerada uma dimensão importante para o estilo de vida e para a saúde das pessoas. Nota-se que o estilo de vida vem sendo estudado de forma fragmentada, não contemplando todas as dimensões, fato que poderia contribuir para sua melhor compreensão.

Tabela 2: Tendências (2014-2016) relacionadas às componentes do estilo de vida da população afrodescendente nas publicações analisadas (n=20)

Tendências atuais

Quantidade nos estudosα

Estudos que abordam a dimensão atividade física

14 (70%).4,14-20,23-27,31

Estudos que abordam a dimensão nutrição

09 (45%).4,13,17,19,21,23,27, 28,31

Estudos que abordam a dimensão controle do estresse

01 (5%).30

Estudos que abordam a dimensão comportamentos preventivos

11 (55%).4,17,18,22-26,29-31

Estudos que abordam a dimensão relacionamentos

*

*dimensão do estilo de vida não abordada pelos estudos analisados.

αas dimensões do estilo de vida podem aparecer no mesmo estudo simultaneaneamente.

Fonte: dados da pesquisa, 2017.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente estudo identificou-se que, o estilo de vida da população afrodescendente foi avaliado por meio das dimensões: atividade física, nutrição, comportamentos preventivos (controle da pressão arterial e colesterol, comportamento sexual, tabagismo e etilismo) e controle do estresse. Percebeu-se que existe uma fragmentação ao estudar o estilo de vida, ou seja, as dimensões são investigadas separadamente, sem considerar o conjunto de hábitos dos pesquisados. As dimensões atividade física e nutrição mostraram-se mais presentes nos estudos. Observou-se que nenhum estudo, com a população afrodescedente, abordou a dimensão referente aos relacionamentos.

A ênfase nas dimensões identificadas pelo presente estudo pode servir de alerta às prioridades de intervenção sobre estilo de vida da população afrodescendente pelos sistemas de saúde. Sugere-se que outros estudos, com esta população específica, possam abordar mais dimensões e contemplem o estilo de vida extrapolando o pentáculo do bem-estar, a exemplo dos comportamentos sedentários. E assim fornecer mais informações aos profissionais que atuam na assistência à saúde, e contribuir na criação e reformulação de ações e políticas de saúde.

REFERÊNCIAS

1 Nahas M. Atividade física, saúde e qualidade de vida: conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 6ª ed. Londrina: Midiograf;2017.

2 Word Health Organization (WHO). Global status report on noncommunicable diseases 2014 [Internet]. 2019[cited 2019 Jun 29]. Available in: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/148114/9789241564854_eng.pdf;jsessionid=9939D785AE5471BCCD32A760FE0111B6?sequence=1

3 Gomes KO, Reis EA, Guimarães MDC, Cherchiglia ML. Utilização de serviços de saúde por população quilombola do Sudoeste da Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública (Online). [Internet]. 2013[acesso em 2019 jun 29];29(9):1829-42. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v29n9/a22v29n9.pdf

4 Kochergin CN, Proietti FA, César CC. Comunidades quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil: autoavaliação de saúde e fatores associados. Cad. Saúde Pública (Online). [Internet]. 2014[acesso em 2019 jun 29];30(7):1487-501. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v30n7/0102-311X-csp-30-7-1487.pdf

5 Santos RG, Tocatins FR. Equity in primary health care for the black population: integrative review. Rev. enferm. UFPE on line. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];9 Suppl3:7695-701. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/10510/11387

6 Bezerra VM, Andrade ACS, César CC, Caiaffa WT. Comunidades quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil: hipertensão arterial e fatores associados. Cad. Saúde Pública (Online). [Internet]. 2013[acesso em 2019 jun 29];29(9):1889-902. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v29n9/a27v29n9.pdf

7 Atiase Y, Farni K, Plange-Rhule J, Luke A, Bovet P, Forrester TG, et al. A comparison of indices of glucose metabolism in five black populations: data from modeling the epidemiologic transition study (METS). BMC public health (Online). [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];15(895):1-10. Available from: https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12889-015-2233-0

8 Tsujimoto T, Kajio H, Sugiyama T. Obesity, diabetes, and length of time in the United States: analysis of National Health and Nutrition Examination Survey 1999 to 2012. Medicine (Baltimore) [Internet]. 2016[cited 2019 Jun 29];95(35):p e4578. Available from: https://journals.lww.com/md-journal/Fulltext/2016/08300/Obesity,_diabetes,_and_length_of_time_in_the.27.aspx#pdf-link

9 Cooper RS, Forrester TE, Plange-Rhule J, Bovet P, Lambert EV, Dugas LR, et al. Elevated hypertension risk for african-origin populations in biracial societies: modeling the epidemiologic transition study. J. hypertens. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];33(3):473–81. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4476314/pdf/nihms-697084.pdf

10 Nahas MV, Barros MVG, Francalacci V. O Pentáculo do bem-estar: base conceitual para avaliação do estilo de vida de indivíduos ou grupos. Rev. bras. ativ. fís. saúde. [Internet]. 2000[acesso em 2019 jun 29];5(2):48-59. Disponível em: http://rbafs.org.br/RBAFS/article/view/1002/1156

11 Ganong LH. Integrative reviews of nursing research. Res. nurs. health. [Internet]. 1987[cited 2020 Jun 10];10(1):1-11. Available from: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1002/nur.4770100103

12 Melnyk BM, Fineout-Overholt E. Making the case for evidence-based practice. In: Melnyk BM, Fineout-Overholt E. Evidencebased practice in nursing & healthcare. A guide to best practice. [Internet] Philadelphia: Lippincot Williams & Wilkins; 2005[cited 2020 Jun 10]. p.3-24 Avalaible from: https://epdf.pub/queue/evidence-based-practice-in-nursing-amp-healthcare-a-guide-to-best-practice.html

13 Tantamango-Bartley Y, Knutsen SF, Knutsen R, Jacobsen BK, Fan J, Besson WL, et al. Are strict vegetarians protected against prostate cancer? Am. j. clin. nutr. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];103(1):153-60. Available from: https://academic.oup.com/ajcn/article/103/1/153/4569296

14 Derose KP, Han B, Williamson S, Cohen, DA RAND Corporation. Racial-ethnic variation in park use and physical activity in the city of Los Angeles. J. urban health. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];92(6):1011–23. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4675738/pdf/11524_2015_Article_9994.pdf

15 Upchurch DM, Rainisch BW, Chyu L. Greater leisure-time physical activity is associated with lower allostatic load in white, black, and mexican-american midlife women: findings from the national health and nutrition examination survey, 1999–2004. Womens health issues [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];25(6):680–7. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4641768/pdf/nihms711959.pdf

16 Cesari M, Vellas B, Hsu F, Newman AB, Doss H, King AC, et al. A physical activity intervention to treat the frailty syndrome in older persons—results from the LIFE-P study. The journal of gerontology [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];70(2):216–22. Available from: https://academic.oup.com/biomedgerontology/article/70/2/216/2947705

17 Yaghjyan L, Wolin K, Chang S, Colditz G. Racial disparities in healthy behaviors and cancer screening among breast cancer survivors and women without cancer: national health interview survey 2005. Cancer causes control. [Internet]. 2014[cited 2019 Jun 29];25(5):605–14. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4097016/pdf/nihms-610393.pdf

18 McKibben RA, Zhao D, Lutsey PL, Schneider ALC, Guallar E, Mosley TH, et al. Factors associated with change in 25-hydroxyvitamin d levels over longitudinal follow-up in the ARIC Study. J. clin. endocrinol. metab. [Internet]. 2016[cited 2019 Mar 29];101(1):33-43. Available from: https://academic.oup.com/jcem/article/101/1/33/2806493

19 Boucher AB, Adesanya EAO, Owei I, Gilles AK, Ebenibo S, Wan J, et al. Dietary habits and leisure-time physical activity in relation to adiposity, dyslipidemia, and incident dysglycemia in the pathobiology of prediabetes in a biracial cohort study. Metabolism [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];64(9):1060-7. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4828921/pdf/nihms697917.pdf

20 Matthews CE, Cohen SS, Fowke JH, Han X, Xiao Q, Buchowski MS, et al. Physical activity, sedentary behavior, and cause-specific mortality in black and white adults in the southern community cohort study. Am. j. epidemiol. [Internet]. 2014[cited 2019 Jun 29];180(4):394–405. Available from: https://academic.oup.com/aje/article/180/4/394/2739209

21 Fraser G, Katuli S, Anousheh R, Knutsen S, Herring P, Fan J. Vegetarian diets and cardiovascular risk factors in black members of the Adventist Health Study-2. Public health nutr. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];18(3):537–45. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4167463/pdf/nihms609138.pdf

22 Kulshreshtha A, Vaccarino V, Goyal A, McClellan W, Nahab F, Howard VJ, et al. Family history of stroke and cardiovascular health in a national cohort. J. stroke cerebrovasc. dis. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29]; 24(2):447–54. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4315691/pdf/nihms648579.pdf

23 Villegas R, Takata Y, Murff H, Blot WJ. Fish, omega-3 long-chain fatty acids, and all-cause mortality in a low-income US population: results from the Southern Community Cohort Study. Nutr. metab. cardiovasc. dis. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];25(7):651–8. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4557690/pdf/nihms695366.pdf

24 Aragão JA, Bós AJG, Souza GC. Síndrome metabólica em adultos e idosos de comunidades quilombolas do centro-sul do Piauí, Brasil. Estud. interdiscip. envelhec. [Internet]. 2014[acesso em 2019 jun 29];19(2):501-12. Disponível em:

https://seer.ufrgs.br/RevEnvelhecer/article/view/41851/32761

25 Silva TSS, Bomfim CA, Leite TCR, Moura CS, Belo NO, Tomazi L. Hipertensão arterial e fatores associados em uma comunidade quilombola da Bahia, Brasil. Cad. saúde colet., (Rio J.). [Internet]. 2016[acesso em 2019 jun 29];24(3):376-83. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v24n3/1414-462X-cadsc-24-3-376.pdf

26 Santos LRCS, Assunção AA, Lima EP. Back pain in adults living in quilombola territories of Bahia, Northeastern Brazil. Rev. saúde pública (Online). [Internet]. 2014[cited 2019 Jun 29];48(5):750–7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v48n5/0034-8910-rsp-48-5-0750.pdf

27 Toselli S, Zaccagni L, Celenza F, Albertini A, Gualdi-Russo E. Risk factors of overweight and obesity among preschool children with different ethnic background. Endocrine. 2015[cited 2020 Jun 10];49(3):717–25. Available from: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs12020-014-0479-4

28 Bärebring L, Schoenmakers I, Glantz A, Hulthén L, Jagner A, Ellis J, et al. Vitamin D status during pregnancy in a multi-ethnic population-representative swedish cohort. Nutrients. [Internet]. 2016[cited 2019 Jun 29];8(10):nu8100655. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5084041/pdf/nutrients-08-00655.pdf

29 Sonnenberg P, Ison CA, Clifton S, Field N, Tanton C, Soldan K, et al. Epidemiology of mycoplasma genitalium in British men and women aged 16–44 years: evidence from the third national survey of sexual attitudes and lifestyles (Natsal-3). Int. j. epidemiol. [Internet]. 2015[cited 2019 Jun 29];44(6):1982–94. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4690003/pdf/dyv194.pdf

30 Agyei B, Nicolaou M, Boateng L, Dijkshoorn H, Born BVD, Agyemang C. Relationship between psychosocial stress and hypertension among Ghanaians in Amsterdam, the Netherlands – the GHAIA study. BMC public health (Online). [Internet]. 2014[cited 2019 Mar 28];14(692). Available from: https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/1471-2458-14-692

31 Paynter NP, LaMonte MJ, Manson JAE, Martin LW, Phillips LS, Ridker PM, et al. Comparison of lifestyle-based and traditional cardiovascular disease prediction in a multiethnic cohort of nonsmoking women. Circulation. [Internet]. 2014[cited 2019 Jun 29];130:1466-73. Available from: https://www.ahajournals.org/doi/pdf/10.1161/CIRCULATIONAHA.114.012069

Data de submissão: 20/03/2019

Data de aceite: 26/05/2020

Data de publicação: 15/06/2020



[1] Profissional de Educação Física. Mestre em Educação Física. Universidade do Estado da Bahia (UNEB). E-mail: cbalmeida@uneb.br http://orcid.org/0000-0001-9486-7163

[2] Cirurgião-Dentista. Doutor em Odontologia Preventiva e Social. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UNEB). E-mail: cacasotti@uesb.edu.br http://orcid.org/0000-0001-6636-8009





Direitos autorais 2020 Universidade Federal de Pelotas

Licença Creative Commons
Esta obra está licenciada sob uma licença Creative Commons Atribuição - NãoComercial 4.0 Internacional.