“Passem e vejam”; o pavilhão de feira como espaço liminar na Galiza de Franco
Resumo
Esta investigação debruça-se sobre o modo como espetáculos marginais como as marionetas de feira vieram a desempenhar um papel na geração de liminaridades num período de grave repressão como foi a Ditadura de Franco no território da Galiza (Estado Espanhol). Será a partir do caso do pavilhão da Barriga Verde que defenderemos a hipótese de que o espetáculo popular de feira possa ter vindo a contribuir para a geração de espaços liminares em que os privilégios sociais ficavam momentaneamente suspensos e a ideologia dominante acabava por ser desafiada. Importa referir que o espetáculo se desenvolvia nas feiras, contexto propício à dissolução das hierarquias. Assim sendo, na Idade Média tinha florescido o realismo grotesco como cosmovisão subalterna (Bakhtin), vigente no imaginário popular galego na primeira metade do s. XX. Nos anos mais duros da repressão franquista, as feiras, que continuaram a exercer um importante papel de socialização na Galiza, auspiciaram o surgimento de imagens alternativas à cultura oficial. O espetáculo de bonifrates que oferecia uma família de artistas ambulantes no interior do pavilhão de Barriga Verde integrava aquele imaginário com recurso a um repertório herdado da tradição europeia dos bonecos da cachaporrada e um misto de expressões da cultura popular galega. No artigo será ainda defendida a ideia de que durante o tempo variável que durava o espetáculo, visível e público para todas as pessoas que o quisessem presenciar, uma dupla mensagem era espalhada, com diferentes interpretações de acordo com a origem social de quem assistisse à performance. O discurso oculto das subalternas (Scott) acabava por ser colocado no espaço público que o palco representava de forma que se tornava invisível para quem ostentava o poder na altura.
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