RESTAURAÇÃO DA PINTURA A ÓLEO PAISAGEM DE MORENA JOBIM

Lindsay Rocha Taveira, Andréa Lacerda Bachettini

Resumo


O presente trabalho relata a restauração da pintura de cavalete à óleo intitulada “Paisagem” de autoria de Morena Jobim, realizada pela autora no Curso de Bacharelado em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), durante a disciplina de Conservação e Restauração de  Pintura ministrada pela Prof.ª Dr.ª Andréa Lacerda Bachettini, no ano de 2017. A restauração é a atividade que age diretamente sobre os objetos quando os meios preventivos não são suficientes para mantê-los em boas condições, aplicando os tratamentos necessários que permitam a sobrevivência dos bens culturais ou remediam os danos que apresentam. A restauração tornou-se uma área que requer do restaurador além de capacidade técnica, conhecimentos científico-técnicos, histórico-artístico, sobre fatores de degradação e conservação, onde várias abordagens devem ser realizadas com uma visão interdisciplinar com outros especialistas (MANUEL, 2002, p. 2930). A obra é de aproximadamente do ano de 1915, possui dimensões de 100cm x 0,71cm com moldura, e 0,85cm x 0,55cm sem moldura. Representa uma cena da natureza, com montanhas, rio, árvores, pássaros, vegetações e um céu iluminado por tons claros que contrastam com os tons terrosos e esverdeados da natureza. A pintura de paisagem do século XIX tem no impressionismo expressão destacada, observando-se a suspensão dos contornos e pinceladas justapostas, o aproveitamento da luminosidade, o uso de cores complementares, e a luz produz um efeito material na obra, sem brilhos e nem transparências. Pertenceu à família da senhora Harriet Lori Furmeister Roessler avó materna do senhor Rafael Olivé Leite que atualmente possui a obra em seu acervo particular. Inicialmente, a pintura encontrava-se alterada pelo verniz oxidado e pela presença de sujidades. Na camada de preparação fina, evidencia-se o estrato pictórico que contém empastes de tinta e evidências das direções das pinceladas em algumas áreas. Havia lacunas, rasgos na tela, orifícios causados por deteriorações e perdas da camada pictórica. Não havia a presença de repinturas, nada foi detectado pela fotografia de fluorescência de UltraVioleta (UV), que é realizada com lâmpada de Wood em um ambiente escuro, onde “a diferente fluorescência dos materiais permite determinar o estado da superfície, do verniz, detectar repinturas, adições, e auxilia nos processos de limpeza” (MANUEL, 2002, p. 63-64). O suporte é constituído de linho, provavelmente industrial, cuja trama é fechada e apertada, e o fio é fino. Com o recurso de um conta-fios, foram contabilizados, o tecido de trama tafetá em linho, fios de trama 33 cm² e fios de urdidura 44 cm². À vista, constatava-se algumas irregularidades e rugosidades, provavelmente decorrentes do seu estado de conservação. Havia a presença de desgastes em algumas regiões que tornam o suporte visível e, perdas que foram confirmadas pela fotografia de fluorescência de UltraVioleta. A moldura de madeira, é detalhada em gesso, com douramento em tom bronze, com desenhos florais em alto relevo e em suas laterais possui um filete marmorizado em tons de bronze, apresentava algumas perdas do suporte e alguns craquelês. Foi confeccionado um novo bastidor para a obra, com as dimensões 82cm x 52,5cm x 2,0cm. Este recebeu a aplicação de piretroide da marca Pentox com pincel de cerdas macias, com a finalidade de se evitar futuros ataques de insetos xilófagos. A tela foi estirada no novo bastidor com o auxílio de um puxador e grampeador profissional, evitando abaulamentos do suporte têxtil. Durante o estiramento, com a força mecânica empregada no processo, o canto superior esquerdo (olhando pela frente da tela) rasgou, mas sem atingir área de pintura. Assim, foi executada no local do rasgo a aplicação do adesivo Beva 371 em filme, pelo interior da tela, com o auxílio de espátula térmica, a Beva 371 necessita de calor para unir as partes desejadas e assim continuar o estiramento. Antes de intervir na camada de verniz que recobre a obra, se iniciou as provas de solubilidade que “auxiliaram na escolha da substância ideal para a remoção do verniz sem afetar a camada pictórica”, baseados nos estudos de Liliane Masschelein-Kleiner “sobre o poder de penetração dos solventes e as consequências derivadas da escolha de uma determinada solução para cada caso”. A mescla mais efetiva foi isoctano + álcool etílico (proporção 1:1) que retirava o verniz, mas causou um efeito esbranquiçado na superfície. Para retirar o efeito 

esbranquiçado, restaurar e saturar a cor da camada pictórica aplicou-se terebentina + álcool etílico (proporção 2:1) com pincel de cerdas macias. (BARBOSA, VILLA, 2013, p. 106) Após a retirada de todo o verniz, foi aplicado um novo verniz de resina natural Dammar para proteger a camada pictórica e poder realizar o nivelamento das lacunas e a reintegração cromática da pintura. O nivelamento das lacunas foi feito com a aplicação de massa de nivelamento com gesso e cola PVA da marca Coral com o auxílio de espátula metálica, e que precisa secar antes de dar prosseguimento à intervenção. Esse procedimento é necessário antes da reintegração cromática, onde a lacuna recebe uma camada que atua como base preparação da tela. A reintegração cromática foi realizada em todas as áreas de lacunas, após o nivelamento, utilizando a técnica do ilusionismo ou mimética, “levando em conta uma série de fatores, como a extensão e forma das lacunas, o tamanho, a documentação existente, a funcionalidade, o estilo, o caráter da obra, entre outros parâmetros” (BAILÃO, 2011, p. 46, apoud PHILIPPOT, PHILIPPOT, 1959, p. 9; BERGEON, 1990, p. 194). Para se obter um resultado mimético se mistura “as cores na paleta até encontrar o tom semelhante à zona próxima que circunda a lacuna”. “A reintegração mimética é, na maioria das vezes, exigida pelos proprietários, pelas galerias de arte, antiquários e colecionistas”, devido à estética alcançada (BAILÃO, 2011, p. 48-49). Inicialmente se utilizou a tinta para restauro da marca Maimeri diluída com xilol, mas devido à toxicidade do solvente, passou-se a utilizar a tinta aquarela da marca Pentel Arts diluída com água. Optouse pelo uso de ambas por serem materiais reversíveis e estáveis. Segundo Viñas (2003, p. 108) os materiais adicionados a uma obra de arte devem ser reversíveis, pois não sabemos como se dará o envelhecimento desses materiais sobre suportes distintos, e, podem ser descobertos materiais de restauração mais adequados, que podem ser utilizados em restaurações futuras, levando assim a retirada dos materiais usados. Após a reintegração cromática foi aplicada duas camadas de verniz de proteção da resina natural Dammar diluído em Aguarrás + cera microcristalina, com compressor portátil. A resina Dammar trás a saturação da cor original da tela e a cera microcristalina tira o brilho que a resina possui e gera um aspecto fosco à pintura. A moldura foi higienizada com trincha de cerdas macias. As partes faltantes foram preenchidas com a massa de nivelamento com cola PVA da marca Coral e após secagem, foram esculpidas com auxílio de bisturi nas formas que cada parte possuía anteriormente. A reintegração cromática da moldura foi realizada com aquarela da marca Pentel Arts diluída em água, utilizando a técnica do ilusionismo. O douramento da moldura foi refeito com a aplicação de pó de ouro. Colocou-se a tela na moldura e sua fixação foi realizada com ganchos e parafusos pelo verso. A pintura, após a restauração, mostrou-se de modo geral, em bom estado de conservação. As lacunas foram reintegradas com materiais reversíveis e estáveis que proporcionou uma leitura mais harmoniosa dos planos, cores e profundidades da pintura. O verniz natural aplicado sobre a tela após o restauro trouxe a saturação das cores, que até então estavam esmaecidos, dando mais vida a estética da obra. A conservação e restauração de pintura de cavalete é um assunto amplamente discutido ao nível social desde o século XIX, onde os critérios aplicados pelo restaurador estão intimamente ligados à percepção visual da pintura, e aos diversos valores que esta possui na sociedade. Preservar, salvaguardar, cuidar, manter e gerenciar o bem patrimonial é o que motiva todo esse trabalho, tentando estabilizar as ações naturais do tempo, perpetuando as memórias, histórias e valores, para as futuras gerações.

Palavras-chave: Restauração. Pintura. Conservação.


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